Xeque - Marcelo Bancalero
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Leiam os artigos;
PREFÁCIO
Mensalão: a história de uma farsa (prefácio)
A história de uma farsa – Capítulo 2: O caso Visanet
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Prefácio: Mensalão, a história de uma farsa.
Capítulo 1: Acusações contra Pizzolato lembram Dreyfus e Kafka.
Capítulo 2: O caso Visanet.
Capítulo 3: As bombas lá fora.
Capítulo 4: Tirem as crianças da sala.
Capítulo 5: As bombas aqui dentro.
Capítulo 6: A história não anda de avião.
Capítulo 7 - O julgamento do povo
Capítulo 8: A pedrinha de David
Capítulo 9: O papel da mídia
Veja todos na íntegra aqui;
PREFÁCIO
Mensalão: a história de uma farsa (prefácio)
Enviado por Miguel do Rosário on 11/05/2013 – 3:25 pm
Alguns livros já foram escritos sobre o mensalão enquanto processo político, outros tanto sobre o julgamento. Entramos agora, porém, numa outra fase bibliográfica, muito mais decisiva. Junto com as últimas defesas dos réus (os embargos), vieram à luz uma série de documentos até então subtraídos à consulta pública. Estes documentos vieram se somar à perplexidade, até hoje não superada, em relação ao sinistro circo que assistimos em 2012, quando juízes da mais alta corte rasgaram os princípios básicos do direito moderno, do bom senso e da própria jurisprudência para chancelarem um justiçamento que interessava a poderosos agentes do conservadorismo político nacional.
A mentira segue o padrão de uma doença. Ela fere o corpo com enorme virulência num primeiro momento; em seguida, o uso dos remédios certos e, sobretudo, a entrada em ação de anticorpos, gera um período de convalescença; por último, o corpo humano pode sair fortalecido. Digo “pode sair”, porque é preciso que tenha, efetivamente, vencido a doença; em caso contrário, poderá sofrer uma reincidência muito mais lesiva, ou mesmo fatal.
O processo do mensalão caminha por duas vias, que às vezes se tocam, em outras se afastam, mas desde o início interagindo intensamente. Numa, há o julgamento nas instituições. Noutra, na opinião pública. Nas instituições (STF e, eventualmente, alguma corte internacional), o julgamento se aproxima do fim de um ciclo. Na opinião pública, a última palavra não é dada por nenhum ajuntamento burocrata, doméstico ou estrangeiro, e sim por esta vetusta, calma e irônica senhora chamada História. Neste campo, o julgamento ainda está só começando.
Agora sim, as pessoas têm acesso aos documentos. Não documentos periféricos, referentes a detalhes do processo, mas documentos estratégicos, centrais, que determinam e embasam todas as acusações e todas as defesas.
Agora sim, terminado o ruflar histérico de tambores que testemunhamos em 2012, num julgamento realizado em paralelo a um processo eleitoral, podemos analisar o processo do mensalão com serenidade. Podemos escutar as versões dos réus, ler os documentos, conversar francamente sobre o que realmente aconteceu naquele período.
Temos ainda um mínimo de distanciamento histórico para entender uma série de coisas. Mais importante que tudo: entendemos hoje os resultados profundamente danosas à democracia se não levarmos esse debate às últimas consequências.
É aí voltamos a nos encontrar com o que existe de mais sólido em nós mesmos. Não apenas queremos saber a verdade, a verdade nua e crua: nesse ponto, queremos agir com a seriedade que faltou aos juízes. Queremos ler, reler e analisar os documentos, alguns deles só há pouco disponibilizados ao público. São estes documentos que nos dão base para assumir uma postura bem diferente a partir de agora. Não mais na defensiva. Queremos encetar um contra-ataque político que vise cobrar uma parte, ao menos, do profundo dano moral que as arbitrariedades causaram a milhões de brasileiros e à democracia.
Não temos interesse de eximir o PT dos erros e dos crimes que tenha cometido. Mas a questão já não é o PT. A questão, hoje, é a discussão da verdade, a denúncia do arbítrio, da mentira, e do insuportável risco à democracia que é a conversão do Supremo Tribunal Federal num instrumento político e partidário manipulado por interesses econômicos obscuros.
Os documentos provam que a teoria do mensalão não se sustenta. Podemos admitir, com profunda tristeza, que um STF corrompido pela vaidade e pela chantagem, possa enveredar pelo arbítrio e agir na contramão da ética e da legalidade. Isso nos deixa consternados e preocupados, mas um processo político ainda é algo maior que tudo isso. O que não deixaremos passar, jamais, é a manipulação da história. Os ministros do STF, a mídia, a procuradoria geral da república serão denunciados às futuras gerações como protagonistas de uma vergonhosa página da política brasileira. A Constituição Brasileira não é apenas um punhado de leis. Ela encarna um espírito, uma visão de mundo, um destino. E nisto houve uma traição imperdoável dos juízes aos valores encorpados na Carta Magna.
O PT não é santo. Houve caixa 2 nas campanhas de 2002, 2004, 2006, possivelmente em todas as campanhas petistas. O PT foi o único partido que assumiu francamente a culpa de fazer o que todos faziam: caixa 2.
Mas o STF fez de tudo justamente para derrubar a teoria do caixa 2 e, contra todas as evidências documentais, produziu uma tese fictícia, sustentada sobre declarações vazias, testemunhos contraditórios e ilações descabidas. As maiores lideranças políticas de uma geração foram condenadas sem apresentação de nenhuma prova. A mídia conseguiu derrubar líderes eleitos para glorificar heróis no Ministério Público e no Judiciário – o que não seria exatamente um problema não fosse a quantidade constrangedora de erros crassos, contradições, injustiças, que caracterizaram o julgamento.
Lembrando o ditado popular, é hora da onça beber água. Contra o arbítrio, vamos contrapor o debate democrático, à luz do dia, transparente, feito com serenidade, amparados em documentos. Eu farei a parte que me cabe como jornalista, blogueiro e intelectual: trabalhar duro, escrever, ponderar, analisar. O Paulo Moreira Leite escreveu um excelente livro sobre o tema, mas há um manancial de informações ainda não explorado e, sobretudo, não concatenado num conjunto.
Em suma, durante as próximas semanas, O Cafezinho publicará uma série de artigos diários sobre o mensalão, ancorado em documentos e entrevistas com pessoas que sabem, com relativa precisão, tudo o que, de fato, aconteceu.
O primeiro artigo foi no domingo à tarde, dia 12 de maio de 2013, fruto de uma longa entrevista que realizei por esses dias com Henrique Pizzolato, além de muitos documentos.
Ao cabo de algumas semanas ou meses, possivelmente publicaremos um livro. Felizmente já existe um bom filão no mercado para quem deseja explorar o outro lado das histórias midiáticas, como mostraram as tiragens espetaculares da Privataria Tucana, de Amaury Ribeiro Jr, e da A Outra História do Mensalão, de Paulo Moreira Leite. A direita platinada publicou uma dezenas de livros com a sua versão sobre o mensalão. A esquerda agora inicia a produção de sua própria bibliografia.
PS: Diante da importância pública do debate, e porque ainda temos esperança de que algumas injustiças sejam corrigidas no julgamento dos embargos, deixarei os posts abertos. Para pagar ao menos parte deste empreendimento, que não será moleza, conto com a sua generosidade na forma de doações (clique aqui) ou assinaturas do blog O Cafezinho(aqui).
A história de uma farsa –
Capítulo 1- Acusações contra Pizzolato lembram Dreyfus e Kafka
Capítulo 1- Acusações contra Pizzolato lembram Dreyfus e Kafka
Enviado por Miguel do Rosário on 12/05/2013 – 4:48 am
A história de uma farsa – Capítulo 1
Pizzolato, o único ”judeu” na diretoria do BB
Para melhor entender um acontecimento que envolve pessoas, façamo-lo a partir do ponto-de-vista individual. Talvez possamos nos comunicar mais produtivamente se começarmos nossa história a partir de um personagem menos visado, como Henrique Pizzolato, ex-diretor de marketing do Banco do Brasil. Iniciar uma abordagem sobre os erros no julgamento do mensalão a partir de Pizzolato tem a vantagem de evitarmos, por enquanto, a furiosa politização provocada pelos nomes de Dirceu e Genoíno, os mais graduados na hierarquia petista. E as falhas inúmeras encontradas na denúncia contra Pizzolato tem o potencial de fazer ruir um edifício acusatorio cada vez mais condenado por suas deficiências estruturais.
A história de Pizzolato lembra a saga do tenente francês Albert Dreyfus, pintada com tintas kafkianas. Dreyfus era o único judeu entre os oficiais suspeitos de uma traição a um governo estrangeiro, e por isso foi apontado, com base em provas falsas e ilações enviesadas, como culpado de espionagem. Era inocente, mas virou um símbolo máximo do ambiente de guerra midiática que tomara conta da França ao final do século XIX, quando políticos e donos de jornais disputavam a primazia de quem melhor manipulava a opinião pública. O ódio profundo nascido das lides entre dryfusards e antidreyfusards, e o proselitismo político que se fazia em torno da questão, nos remete à deliberada campanha udenista deflagrada por setores da mídia e da oposição quando se percebeu o uso político que se poderia dar aos escândalos de caixa 2 protagonizados por Marcos Valério e PT.
O nosso Dreyfus é Henrique Pizzolato. Era o único petista numa diretoria só de tucanos, todos indicados para seus cargos na era FHC, numa instituição antes e hoje controlada e presidida por executivos identificados com o PSDB. Foi capturado a dedo. Era o único “judeu” no grupo. A maneira como tudo acontece, por sua vez, lembra uma trama de Kafka: um suceder frenético, galopante, ininterrupto de acusações vagas, mal formuladas, confusas, embora invariavelmente pesadíssimas porque expostas com grande sensacionalismo midiático.
Como se um procurador e um juiz tivessem o poder de dizer que você é chinês, e provar isso, independentemente de seu passaporte ser brasileiro, você ter cara de brasileiro e falar português fluentemente como só um brasileiro poderia fazer. Não importa, você é chinês e pronto, decreta o juiz, batendo o martelo. Os jornais todos divulgam no dia seguinte, em manchetes garrafais, que ficou provada sua origem chinesa. E ai de você se quiser protestar.
A acusação contra Pizzolato é simplesmente surreal. Diferentemente de Dirceu e Genoíno, que ao menos incorporam fantasmagóricas responsabilidades políticas pelo “esquema” de compra de apoio político, contra Pizzolato há uma acusação bem direta: de ter sido o responsável pelo desvio dos R$ 73,8 milhões que a Visanet pagou a DNA Propaganda. A denúncia serviria para caracterizar os recursos que Marcos Valério, um dos sócio da DNA, distribuiu a parlamentares, como dinheiro público, com isso enfraquecendo a tese de caixa 2 defendida pelos réus.
Entretanto, os documentos comprovam quatro erros crassos na denúncia. A Visanet é privada; Pizzolato não tinha qualquer ingerência no contrato entre a empresa e a DNA Propaganda; ele nunca foi o responsável pela relação entre o banco e o fundo de publicidade da Visanet; os serviços de publicidade foram realizados.
A DNA Propaganda, hoje praticamente destruída, não era uma agência fictícia. Era a maior agência de publicidade de Minas Gerais, detendo praticamente todas as contas das estatais mineiras, da Telemig (então controlada por Daniel Dantas); havia crescido à sombra do tucanato. Vinha ganhando mercado, obtendo prêmios locais e internacionais, incomodando grandes firmas de São Paulo.
O contrato entre a Visanet e a DNA era perfeitamente legal. Uma empresa que opera no mercado de cartões de crédito contrata uma das maiores agências do país para realizar campanhas publicitárias. As campanhas são realizadas. As auditorias não encontraram nenhuma irregularidade nas campanhas. Há gravações e documentos que comprovam a sua realização.
Quanto aos bônus de volume pagos pelos meios de comunicação à DNA Propaganda, os quais foram considerados, irresponsavelmente, por Joaquim Barbosa, como uma transferência indevida de recursos pertencentes ao BB, também não houve irregularidade. O pagamento de bônus de volume, apesar de eticamente questionável, é uma prática regulamentada no país, e configura uma relação totalmente privada entre meio e agência. Ou seja, entre uma empresa como a Globo, por exemplo, e a DNA. O BB ou o Visanet sequer são informados sobre seus valores.
“Eles estatizaram a Visanet”, ironiza Pizzolato, que vive hoje um período de recuperação moral e emocional.
O lendário jornalista Raimundo Pereira comprou a briga de Pizzolato e vem usando a sua revista Retrato do Brasil para fazer uma denúncia duríssima, embasada em documentos, contra os erros flagrantes de Joaquim Barbosa quando analisa o caso Visanet. Alexandre Teixeira, combativo blogueiro carioca, faz o mesmo através do blog MegaCidadania.
O acordo entre a Visanet e os bancos parceiros sugeria que estes indicassem um gestor com responsabilidade para propor campanhas publicitárias da Visanet e apontar nomes de agências. Aí temos outro intolerável erro de Joaquim Barbosa, porque ele sempre teve em suas mãos, e o ignorou, um laudo com os nomes dos gestores do fundo de 2001 a 2005. Todos “tucanos”. Pizzolato não estava entre eles. Durante o período em que se celebra contrato com a DNA, o gestor era Léo Batista, que assumiu o cargo em 2002, ainda no governo FHC, e ficou até abril de 2005. Trata-se do laudo 2828, mais um entre inúmeros documentos que, apesar de comprovarem a inocência de Pizzolato, foram sistematicamente ignorados, omitidos e até mesmo ocultos pela acusação.
Por onde se olhe a denúncia de Barbosa contra Pizzolato no caso Visanet, se vê apenas um despudorado falseamento da realidade, e a única explicação para isso seria a tentativa de ajustar a realidade à teoria.
Pizzolato, que há mais de sete anos vive um terrível pesadelo moral, acusado por um crime do qual não apenas é inocente, mas que seria impossível de cometer, procura transparecer serenidade e até um pouco de bom humor quando analisa os primeiros trovões que anunciaram a tempestade.
Para a oposição udenista, Pizzolato foi uma vítima útil, uma peça importante no jogo para derrubar o governo. Mesmo no campo da esquerda, as preocupações sempre se voltaram apenas para Dirceu e Genoíno. Mas Pizzolato também era um quadro importante no partido, com uma bela história no processo de luta que culminou na vitória de Lula em 2002. Um dos fundadores do PT no Paraná, Pizzolato foi presidente do sindicato de bancários, da CUT e candidato a vice-governador em seu estado.
Pizzolato testemunhou muita coisa em 2002, e seu depoimento ajuda a esclarecer uma série de pontos obscuros quando se procura entender o aparecimento de Marcos Valério.
Capítulo 2 : O caso Visanet
A história de uma farsa – Capítulo 2: O caso Visanet
Um petista no lugar certo, na hora certa
Trazer o questionamento sobre a lisura no julgamento do mensalão para esta grande ágora pública, a internet, nos permite provocar um debate instantâneo, que nos ajuda a desenvolver nosso trabalho. Os dois primeiros textos já publicados geraram algumas reações negativas curiosas. Um internauta fez uma declaração emocionante: “O PT me fez desacreditar na política, e agora quer me fazer também descrer na Justiça”. Outro se pergunta, perplexo, como pode ser que alguém “não entender que partido político e seus governos, no Brasil, não passam de quadrilhas que vivem meramente de dinheiro público? Assim, o Executivo é o poder que estrutura a corrupção no Brasil. Resta ao Judiciário moralizar e colocar a política em seus trilhos”.
Sem se dar conta, essas críticas apenas reforçam a argumentação central que procurarei expor aqui: a acusação usou e abusou de uma lógica de “linchamento”, que serviu para desqualificar o processo político e as entranhas da nossa jovem democracia. E tudo em prol de soluções de força a serem tomadas pelo Ministério Público e pelo Judiciário, tidos aqui na conta de instâncias “não políticas”. Só que não é verdade. Onde existe poder, existe política. É claro que existe política no MP e no Judiciário, só que de maneira mais obscura do que nas esferas do Estado vinculadas ao sufrágio.
Como nasce um linchamento político? Pega-se uma comunidade revoltada com séculos de corrupção, aponta-se-lhe um culpado, de preferência uma figura pública. Que graça tem pegar um promotor corrupto ou um juiz incompetente. Como não votamos, não nos sentimos culpados por seus crimes. Já um político corrupto gera um sentimento de culpa coletiva. Como fomos idiotas em votar nesse calhorda! Daí para a catarse do linchamento, é o passo seguinte.
Não vamos negar que existam políticos corruptos aos borbotões. E a missão republicana do Ministério Público, do Judiciário, da Polícia Federal, e das próprias institiuições políticas, é combatê-los. O que fazer, contudo, quando os próprios corruptos, numa jogada brilhante, assumem a responsabilidade pelo combate à corrupção e, ao invés de pegar os verdadeiros vilões, miram apenas em seus adversários políticos; e, no lugar de uma investigação séria, se aliam aos meios de comunicação para encetarem inquéritos fajutos, sensacionalistas e tendenciosos?
Pois é, meu inocente amigo, se queres fazer alguma coisa concreta para combater a corrupção no Brasil, terás que se desvencilhar de toda ingenuidade. Existe luta de poder, política e corrupção em todas as instituições da República, incluindo MP e Judiciário. Não digo isso para sufocar a esperança do cidadão comum numa solução ética para o problema político brasileiro. Claro que há! Mas certamente não é linchando inocentes, nem manipulando inquéritos. A busca pela ética na política passa também pela exigência de investigações rigorosas e imparciais, e julgamentos justos, além do fortalecimento da consciência crítica do cidadão, que precisa estar devidamente vacinado contra a demagogia de setores corruptos do MP e do judiciário.
Temos que pegar os corruptos, mas temos que pegar também os corruptos que simulam e manipulam investigações para desviarem a atenção da opinião pública.
E aí voltamos para o caso Visanet e para o indiciamento de Henrique Pizzolato. Todos os laudos, auditorias e documentos à disposição do procurador geral da República, Antônio Fernando de Souza, e do relator da ação junto ao STF, Joaquim Barbosa, provavam a inocência de Pizzolato e, no entanto, ele foi indiciado e depois condenado. Por quê?
Bem, o porque requer uma resposta mais complexa, pois trata de interesses políticos, e vamos discuti-la mais adiante. Por enquanto, podemos analisar outra questão: como? Como a procuradoria e o STF conseguiram a proeza de indiciar e condenar um inocente, à revelia de tantos documentos que provavam o contrário?
Para isso, há uma resposta dura e direta: omissão e má-fé. Quando apareceu o nome da Visanet na CPI e no noticiário, o Ministério Público mandou a Polícia Federal investigar quem eram os responsáveis, dentro do Banco do Brasil, pela relação com a Visanet, sobretudo quem fiscalizava, no BB, as campanhas patrocinadas pelo Fundo de Publicidade da Visanet, nos anos de 2001 a 2005. A investigação foi rápida e fácil. A parceria entre Banco do Brasil e Visanet data de 1999. A partir de 2001, a Visanet cria um fundo de publicidade, alimentado por seus bancos parceiros. Esse fundo continuava sendo propriedade da Visanet, conforme provam todas as auditorias já realizadas. Mas os parceiros tinham direito de orientar campanhas, escolher as agências que as fariam e propor o pagamento das mesmas. Executivos do Banco do Brasil integravam o Conselho de Administração da Visanet, e havia um funcionário do BB com a função de “gestor” do Fundo de Publicidade Visanet.
O nome de Pizzolato sequer aparece no laudo 2828, que reúne as informações coletadas pela Polícia Federal a pedido do Ministério Publico, sobre a relação da Visanet com o Banco do Brasil. Por uma razão simples: como diretor de marketing do BB, Pizzolato não tinha nenhum controle sobre o fundo da Visanet, cuja relação com o BB se dava através da diretoria de Varejo (que lida com cartões de crédito). Pizzolato nunca foi gestor do fundo Visanet. A investigação descobrira ainda que a Visanet mantinha relações com a DNA Propaganda ao menos desde 2001.
Todos os funcionários do BB que mantinham relações com a Visanet (funcionários do BB que integravam o conselho de administração da Visanet, gestores do fundo Visanet, diretores de Varejo, vice-presidente de Varejo, e o próprio presidente do banco) eram remanescentes da era tucana. Todos haviam chegado aos respectivos postos através de nomeações feitas antes da eleição de Lula, e todos se alinhavam ideologicamente ao PSDB.
Entretanto, o laudo2828, mesmo contendo informações vitais à defesa e à compreensão do processo, foi mantido em sigilo para os advogados de Pizzolato e para a opinião pública. O documento foi varrido para debaixo dos espessos tapetes da procuradoria e do STF. Quando a denúncia da Procuradoria foi encaminhada ao STF e começou a ser debatida pelos ministros, o laudo 2828 jamais foi mencionado. O relator da Ação, Joaquim Barbosa, ao arrepio das informações contidas num documento que ele mesmo havia deferido, declara em seu voto:
“Assim, Henrique Pizzolato agiu com o dolo de beneficiar a agência representada por Marcos Valério, que não havia prestado qualquer serviço em prol dos cartões do Banco do Brasil de bandeira Visa, tampouco tinha respaldo contratual para fazê-lo. De fato o contrato entre a DNA Propaganda e o Banco do Brasil não fazia qualquer alusão à Visanet. “
O voto de Barbosa merece um prêmio: conseguiu reunir num pequeno trecho uma quantidade tão grande de inverdades que pode arrumar um emprego fácil como editorialista do jornal O Globo:
1 – Pizzolato não poderia ter agido “com dolo de beneficiar Marcos Valério” porque nunca teve o poder de propor pagamentos para a DNA Propaganda. Essa função era do gestor apontado pela diretoria de Varejo; na época de que trata a acusação, esse gestor era Léo Batista dos Santos.
2 – A DNA Propaganda prestou, sim, serviços ”em prol dos cartões do Banco do Brasil de bandeira Visa”, e tinha total respaldo contratual para fazê-l0, desde 2001.
3 – Havia diversos pareceres à disposição de Barbosa comprovando a relação entre a DNA, BB e Visanet.
Todas essas informações constavam em documentos vários; no caso do Laudo 2828, serviria sobretudo para provar a inocência de Pizzolato, mas o laudo foi oculto. Os advogados de Pizzolato afirmam que, na denúncia da Procuradoria para o STF, o laudo sequer foi anexado. Meses depois, após a denúncia ser aceita pelo STF, o laudo é reintroduzido no banco de dados da acusação.
Pizzolato surge nessa história da seguinte forma. Como diretor de marketing, seu nome aparece em três “notas técnicas”, que eram de circulação interna, sem nenhum poder autorizativo, tratando de questões laterais referentes aos pagamentos a serem emitidos à DNA com recursos do fundo da Visanet. O BB sugeria o pagamento, mas quem o fazia era a Visanet, mediante a apresentação de notas fiscais e comprovantes de realização de serviços por parte da DNA. E a pessoa responsável pela solicitação do pagamento, através de um documento efetivamente autorizativo, era o gestor indicado para essa função, não o diretor de marketing.
Eram pareceres internos, e o nome de Pizzolato aparece, no mesmo grau de hierarquia, junto a outros três diretores. No total, são quatro notas técnicas, um das quais Pizzolato sequer aparece. Porque apenas Pizzolato foi indiciado? A explicação talvez esteja em sua história: tinha sido o primeiro diretor sindical eleito pelos próprios funcionários do banco, ainda antes da redemocratização. Mesmo sendo funcionário de carreira, e tendo ingressado via concurso, o talentoso sindicalista e combativo militante político do Partido dos Trabalhadores seguramente não era benvindo numa instituição dominada por tucanos de alta plumagem.
Mais tarde, contaremos porque o PT entregou o Banco do Brasil ao PSDB.
Ao menos um alto executivo do BB, um dos mais poderosos, também ligado aos tucanos, trabalhou ativamente para incriminar Pizzolato. É Antônio Luiz Rios da Silva, que havia sido vice-presidente de Varejo do Banco do Brasil em 2003, e responsável pela nomeação de todos os funcionários que tinham relação com a Visanet. Este cidadão, simplesmente, saiu do BB para se tornar presidente da… Visanet, função que exerceu no auge das comissões de inquérito que investigavam o mensalão! Um acaso não tão casual, que foi extremamente oportuno para a oposição e trágico para Pizzolato, porque Rios, como presidente da Visanet e ex vice-presidente de Varejo no BB, se recusou a fornecer os documentos que provariam a inocência do petista, nem fez qualquer declaração neste sentido. Descobriu-se também mais tarde mensagens do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Nelson Jobim, avisando Rios de que a Polícia Federal faria investigações nos escritórios da Visanet. Ou seja, todos os tucanos, em todas as altas funções da república, estavam se dando as mãos, solidariamente. (Documentos neste link)
São artimanhas como essas que explicam o indiciamento de Pizzolato. Possivelmente, em meio às turbulentas conspirações que aconteciam nos bastidores das CPIs que investigavam o mensalão, houve um decisão política sobre a trama e os personagens. O nome de Pizzolato aparece quando se projetam os holofotes sobre a relação do Banco do Brasil com a DNA Propaganda. Era o petista no lugar certo e na hora certa.
Mas tudo começa com a figura de Marcos Valério. A oposição tinha que ligar Marcos Valério, suposto “operador financeiro” do mensalão, ao desvio de dinheiro público, e como a DNA Propaganda respondia por contas milionárias junto à Visanet, que por sua vez mantinha contratos com o BB, iniciou-se o esforço para encontrar um petista no BB que pudesse “fechar” a trama já armada por oposição e mídia.
No próximo capítulo, falaremos deste personagem até hoje explosivo: Marcos Valério. De onde ele vem? Porque se torna de repente tão íntimo do PT? Pizzolato participou de reuniões com o alto comando da campanha petista de 2002, e me contou algumas histórias interessantes sobre a situação financeira do partido, e como Valério aparece como “salvador da pátria”.
PS: Diante da importância pública do debate, e porque ainda temos esperança de que algumas injustiças sejam corrigidas no julgamento dos embargos, deixarei os posts abertos. Para pagar ao menos parte deste empreendimento, conto com a sua generosidade na forma de doações (clique aqui) ou assinaturas do blog O Cafezinho(aqui).
http://www.ocafezinho.com/2013/05/13/o-caso-visanet/
Capítulo 3 - As bombas lá fora
Enviado por Miguel do Rosário on 15/05/2013 – 9:23 am
A história de uma farsa – Capítulo 3
As dívidas de campanha
Em algum momento lá trás, eu mencionei o “mínimo distanciamento histórico” em relação aos fatos que produziram o escândalo do mensalão. Preciso agora enfatizar o termo “mínimo”, ou mesmo me contradizer. Não há distanciamento histórico. As bombas ainda explodem lá fora. O editorial do Globo hoje, 15 de maio de 2013, é: “Mensalão recoloca STF em risco”, onde o jornalão assevera que o tribunal “precisa ter consciência de que, ao decidir sobre novo julgamento, pode pôr a perder a credibilidade obtida com sua atuação no caso até agora”. É uma ameaça. O Globo, pela enésima vez, põe uma faca no pescoço dos ministros do STF e diz: vão em frente.
A grande ironia é que o Globo está certo. Só que ao contrário. O STF está, de fato, em risco de se desmoralizar, mas se se curvar mais uma vez aos interesses políticos e às chantagens da família Marinho.
Eu falei nas bombas que estouram lá fora porque me lembrei de um comentário de alguém sobre Jules Michelet, talvez o mais querido historiador francês. Em 1848, Michelet escrevia sobre a revolução francesa enquanto ouvia, do lado de fora de sua casa, as bombas de uma outra revolução acontecendo. Os mesmos princípios estavam em jogo: a república, a democracia, a igualdade social. Michelet era um ardente republicano e defensor dos legados da revolução francesa, mas não podia negar os erros trágicos e brutais das lideranças que assumiram o poder no auge do “terror” jacobino. Michelet, todavia, era inteligente demais para publicar uma denúncia contra a revolução que pudesse ser instrumentalizada por seus adversários políticos para atacar os princípios que ele, Michelet, acreditava. Michelet era o que, mais tarde, os marxistas chamariam de “intelectual orgânico”. Hoje em dia, a historiografia oficial francesa lê Michelet com muita cautela, tentando separar seu engajamento ideológico e seus inegáveis talentos literários dos acontecimentos históricos em si. Após um certo tempo, a academia tende a analisar os fatos com a frieza de um dissecador de cadáveres. Mas todos admitem que, se você quiser sentir um pouco do calor revolucionário que emanava das ruas parisienses, naqueles cinquenta anos a partir da queda da Bastilha; se quiser entender o que aconteceu não apenas de maneira cerebral ou acadêmica, mas apreender sobretudo suas reverberações espirituais, então você precisa ler a História da Revolução Francesa de Jules Michelet.
Ao abordar a aparição de Marcos Valério no palco da história política brasileira, começaremos a falar dos grandes erros do PT. O erro fundamental, naturalmente, foi ganhar as eleições. Um parente meu, alguns meses após a posse de Lula, quando a onda de cobranças deflagrou mais uma fornada “desencantados com a política”, me disse assim mesmo: “O PT não deveria ter ganho”. Não era ironia. Havia muita gente, na própria esquerda, que entendia que o PT não deveria ter ganho, para evitar o processo de corrosão ética e ideológica provocado pelo poder.
Quando escavamos as origens do mensalão, batemos em alguma coisa sólida lá embaixo, guardamos a pá e abrimos o baú encontrado, o que vemos?
A vitória de Lula não representa, naturalmente, apenas a vitória pessoal do ex-metalúrgico, nem somente a ascenção do Partido dos Trabalhadores às funções máximas do Executivo. Há um corte histórico, que nem o mais raivoso inimigo do PT poderá negar. Uma coisa é o que acontece na superfície dos acontecimentos. A festa do povo nas ruas. A cantoria, o choro e as bebedeiras. Outra coisa é o movimento silencioso e profundo das placas tectônicas da história.
Vamos aos fatos.
Primeiro, a campanha. Todos os crimes eleitorais acontecem na campanha. A campanha eleitoral, em si, é o crime fundamental do regime democrático.
Não por outra razão, quando os petistas começam a se recuperar do susto que levaram com o escândalo do mensalão, repetirão em coro: a culpa é das campanhas! Daí nasce o desejo de fazer uma reforma política para tampar o ralo por onde escorre toda a decência e toda a ética.
Só que não vão conseguir. As campanhas eleitorais continuarão, para sempre, sendo um crime político. Porque é nas campanhas que se mobilizam todas as forças, todos os recursos, se amarram todos os compromissos. É nas campanhas que, invariavelmente, vemos despontar no horizonte, caminhando em nossa direção, um homem manco, de rosto estranho, com um pé deformado, semelhando um pé… de cabra.
Perdoem-me a caricatura, que tentarei desfazer mais adiante, mas não posso resistir: que figura mais parecida com o diabo senão aquele risonho moço de careca luzidia chamado Marcos Valério?
A única maneira de pôr fim a este grande crime político, ao crime original, é dar fim às campanhas. Ou seja, é dar fim ao regime democrático e instalar a ditadura. De preferência, uma ditadura de juízes vitalícios. Aí sim, o país poderá respirar aliviado, as classes instruídas poderão olhar, satisfeitas, para os donos do poder, que serão homens cultos e severos, e que não chegaram onde chegaram através de campanhas políticas sujas.
Ah, mas não é somente um crime. As campanhas mobilizam uma grande quantidade de mão-obra. São milhares, quiçá milhões de pessoas trabalhando em todo país, em tudo que é tipo de atividade. A moeda mais valiosa em qualquer campanha é o trabalho. Qualificado, naturalmente. Se há dinheiro para pagar o trabalho, paga-se. Se não se tem, faz-se dívidas. Arrisca-se. As campanhas mobilizam as apostas mais temerárias que se pode conceber. Empresários, ativistas, políticos, donas de casa, todo mundo aposta alguma coisa.
Após a vitória, Lula chama a equipe que coordenava a questão do financiamento de sua campanha. Obviamente, sempre fora a questão crucial para a vitória. E deixemos claro uma coisa: o PT não ganhou as eleições apenas por causa do amor dos companheiros à causa. A campanha de Lula foi rica em recursos. E falo do Caixa 1, contabilizado. O professor Wanderley Guilherme dos Santos fez um levantamento das eleições de 2002 e verificou que Lula ganhara mais dinheiro que seu adversário, José Serra. Os empresários brasileiros, apesar de toda afinidade ideológica com o PSDB, estavam traumatizados pela incompetência do governo FHC. O país quebrara várias vezes, a carga tributária quase dobrara, os juros atingiram níveis insuportáveis. Só quem ganhava dinheiro, em tese, eram os bancos. Mas até os bancos quebraram! O capitalismo brasileiro foi empurrado à força para a esquerda, porque entendeu que precisava de uma coisa básica para continuar produzindo riqueza: consumidores.
Pizzolato, que já participara de várias campanhas e entendia de economia, em função de seu trabalho no Banco do Brasil, era um dos que trabalhavam no núcleo financeiro do comitê e descreve a reunião com Lula em tons vívidos. Os cardeais estavam todos presentes: José Dirceu, Palocci, Gushiken, etc. Lula só pediu uma coisa: quero as contas de campanha totalmente ordenadas. Quero ser diplomado sem a mínima mácula. E assim foi feito. Todos trabalharam como loucos para ordenar sabe-se lá quantos milhares de notas fiscais, preencher sabe-se lá quantas planilhas. Mas tudo foi cumprido à risca e Lula é diplomado com as contas de campanha em dia.
Aí, vem uma outra reunião. A campanha nacional fora paga, mas os dirigentes regionais aparecem com enormes dívidas. Dívida tem que ser paga! Ainda mais naquele Brasil em profunda crise econômica, desemprego altíssimo, como era em 2003. Ouvíamos casos famosos de gente matar outra por dívida de 15 reais. Que dizer então das milionárias dívidas de campanha?
“Então Lula fez uma loucura”, diz Pizzolato, embora mais tarde admita que talvez fosse o melhor a fazer. Quando a gritaria dos diretórios regionais em relação às dívidas começou a ficar alta demais, Lula chamou Delúbio Soares, tesoureiro do partido e mandou: “Resolve isso, Delúbio”. O diretório nacional do PT, por orientação do recém eleito chefe de Estado, assume as milionárias dívidas dos núcleos regionais. O PT, de uma hora para outra, mesmo tendo ganhado as eleições, se tornava uma instituição completamente falida e endividada.
O Delúbio era o cara com mais intimidade com Lula, conta Pizzolato. Quando Lula mandou ele assumir todas as dívidas, ele quase caiu da cadeira e rebateu de pronto: “No meu, não, né, presidente (ele agora já chamava Lula de presidente)! No meu arde!”
Palocci dá um risinho, bate nas costas de Delúbio e diz alguma coisa sobre o peso de “ser governo”.
Delúbio vai atrás de dinheiro. O fundo partidário estava mais liso que a careca de Valério: tudo havia sido gasto para que Lula se diplomasse com as contas pagas, totalmente limpo. Onde está o dinheiro? Nos bancos. Segundo Pizzolato, Delúbio gostava de fumar charutos; quem trabalhava mesmo eram os dois secretários à sua disposição. Vão ao Banco do Brasil pegar emprestado. Só que o patrimônio do PT só permitia ao partido pegar uns 2 milhões de reais. Não dava nem para encher o buraco do dente. A dívida total era mais de 50 milhões de reais. Os bancos não queriam emprestar para o PT por uma questão burocrática básica: o partido tinha um limite baixo.
Ironia quase trágica. O partido que vencera as eleições presidenciais não tinha limite. Mas o empresário Marcos Valério tinha. Ele podia pegar quanto dinheiro quisesse, porque era bem relacionado. “Hoje o pessoal fala mal do Valério, mas na época ele foi o salvador da pátria”, conta Pizzolato.
Com Marcos Valério como avalista, o PT conseguiu levantar dois bons empréstimos com o BMG e o Rural. Parte do problema estava sanado. Até aí tudo bem. Mas ainda faltava dinheiro. Então Valério faz um acerto com Delúbio. Aí nasce, efetivamente, o “mensalão”. Valério faz um empréstimo em seu nome, para pagar as dívidas do PT. Delúbio fazia assim, conta Pizzolato: conforme os diretórios iam ligando para cobrar o pagamento das dívidas, ele ligava para uma secretária de Valério para fazer os pagamentos. Tudo isso acontecia em 2003. Só que o tempo foi passando; em poucos meses, haveria outra eleição. Novas dívidas começaram a surgir…
O Lula? Ele sabia de tudo? Esse e mais detalhes, vamos deixar para o próximo capítulo.
PS: Agradeço profundamente a todos que tem apoiado meu trabalho. Não há ditado mais útil, neste caso, do que “a união faz a força”. Reitero aqui a minha disposição de fazer uma série completa de artigos sobre o mensalão, com base em documentos, entrevistas, mas sobretudo tentando desintoxicar o tema de todo proselitismo conservador e tendencioso que foi se acumulando ao longo do tempo. Peço licença, mais uma vez aos assinantes, para deixar os posts abertos, e libero a sua reprodução em qualquer espaço, desde que dado o link. Se quiser me ajudar a continuar fazendo esse trabalho, pode fazê-lo na forma de doações (clique aqui) ou assinaturas do blog O Cafezinho(aqui).
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A pedrinha de David
Desde o início, o processo do mensalão ofereceu um triste espetáculo de mentiras, traições, covardia. O julgamento no STF não foi diferente. Os ministros mais famosos por seu respeito ao garantismo e à letra da Constituição mancharam sua própria história ao capitularem à infame pressão de uma mídia notoriamente engajada politica e partidariamente.
Entretanto, a história registrará ao menos um exemplo de heroísmo. Um heroísmo prosaico, delicado, feminino, composto apenas de inteligência, amor, lealdade e desejo de justiça.
Falo da gentil e doce Andrea Haas, arquiteta e esposa de Henrique Pizzolato. Quando a história definitiva do julgamento for escrita, seu nome não poderá ser esquecido como aquela que lançou a pedrinha que ajudou a derrubar um dos homens mais poderosos do país, o atual presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa.
A ironia é que diversos réus contrataram os escritórios de direito mais competentes da America Latina, incluindo Marcio Thomaz Bastos, um dos maiores criminalistas brasileiros, mas ao cabo foi Pizzolato, o réu mais frágil financeiramente (seus advogados, embora bons, trabalham praticamente de graça), quem teve a defensora mais combativa e mais astuta. Sua própria esposa.
Quando o mundo inteiro parecia desabar sobre a cabeça do casal, Andrea Haas começou a estudar o caso por conta própria. Sozinha, elaborou para seu marido a mais contundente defesa que um réu jamais sonhou ter. Quase todas as reportagens, documentos e raciocínios lógicos que hoje comprovam, definitivamente, a inocência de Pizzolato, ex-diretor de marketing do Banco do Brasil, e derrubam os pilares de toda a absurda trama criada pela Procuradoria Geral da República, nasceram da luta de uma mulher indignada pela condenação injusta do seu companheiro de toda uma vida, de um homem cujos anseios por justiça social, integridade e coragem, acompanhou e admirou desde a mocidade. (Leia a emocionante carta de Andrea a seu marido).
A última pedrinha com que este David de saias derrubou o Golias – esse estamento híbrido formado por mídia, oposição conservadora e figuras desqualificadas da procuradoria e STF – talvez tenha sido lançada esta semana, com a divulgação em larga escala de uma denúncia gravíssima. Na verdade, essa denúncia apenas completa (ou chega bem perto de completar) um quebra-cabeça, cujo desenho Andrea Haas já conhece há tempos.
A denúncia consta de recente artigo de Maria Inês Nassif. A jornalista do site Carta Maior denuncia, com base em documentos coletados e ordenados logicamente por Andrea, o então procurador geral da república, Antônio Fernando de Souza, e o relator do processo antes do mesmo se tornar a Ação Penal 470, Joaquim Barbosa: eles sabiam da inocência de Pizzolato e, portanto, da inconsistência da tese de acusação, bem antes da denúncia ser discutida e aceita pelo Supremo Tribunal Federal. Não apenas sabiam da existência desses documentos, como os esconderam deliberadamente.
Os leitores então me perguntam: e agora, Miguel? O que acontece? É possível anular Ação Penal 470? Dê sua opinião, por favor!
Diante de inépcia tão flagrante, acho que é possível, sim, anular a Ação Penal 470. E se não for, agora há elementos mais consistentes para se levar o caso a uma corte internacional.
É óbvio, no entanto, que não será fácil. Como no caso Dreyfus, na França, as pessoas e entidades envolvidas na acusação enredaram-se tão profundamente nessa teia de mentiras que será difícil encontrar uma saída “honrosa”. Nada melhor do que um divertido ditado popular para definir a situação em que se encontra o STF: um mato sem cachorro.
Quem será o cachorro a tirar o STF da enrascada em que se meteu, ao se submeter covardemente ao clima de linchamento criado pela mídia?
Como explicar à nação que o tipo de prevaricação cometido pelo Procurador, por Joaquim Barbosa e por alguns outros ministros foi bem pior do que os crimes eventualmente cometidos pelos réus? Muito pior, porque se houve crime (e não posso saber se os réus são inocentes em tudo), com certeza não foi aquele da tese da acusação, enquanto o procurador e Joaquim Barbosa pactuaram com um golpe branco. Os quarenta réus acusados pela denúncia da Procuradoria foram escolhidos da forma mais odiosamente arbitrária e tendenciosa entre os 126 relacionados na CPMI dos Correios. A trama foi discutida e escrita primeiro; depois foram colhendo somente os réus, testemunhas e documentos que podiam corroborá-la. Até mesmo a dona lógica foi posta de lado quando se interpunha no caminho da acusação.
Agora temos provas de que, antes da aceitação da denúncia pelo plenário do STF, o procurador geral da república e Joaquim Barbosa conheciam o Laudo 2828 e outros documentos que inocentavam Pizzolato (e, repito, derrubavam toda a Ação Penal 470), e não só os esconderam dos demais juízes e advogados de defesa, como ainda mentiram descaradamente sobre seu conteúdo.
Vamos focar um pouco na questão das datas, porque elas são fundamentais para se visualizar o grau de sordidez da procuradoria e do ministro Joaquim Barbosa.
O Laudo 2828 é fruto de uma investigação da Polícia Federal junto ao BB e à Visanet, feita a pedido da própria Procuradoria e deferido por Joaquim Barbosa, ao final de 2005. A PGR, no entanto, estranhamente, não aguarda a conclusão do laudo, que acontece em dezembro do mesmo ano, para apresentar a denúncia, em março de 2006. O laudo foi mantido em segredo, inclusive dos próprios ministros do STF (à exceção de Barbosa), antes e durante a aceitação da denúncia, que ocorreu em agosto de 2007. Só foi anexado à Ação Penal em novembro de 2007, meses depois do STF aceitar (com a faca no pescoço, conforme disse Lewandowski) uma denúncia inepta, e dois dias depois da publicação do seu acórdão. Os ministros, quando julgaram a validez da denúncia, não tiveram acesso a um dos documentos mais esclarecedores da Ação Penal.
Hoje temos à nossa disposição documentos contendo datas e carimbos que comprovam a postura desonesta da PGR e de Barbosa, e há uma novidade. Há apenas algumas semanas, ficamos sabendo que os mesmos atores (PGR e Barbosa) usaram de um artifício maquiavélico para esconder os documentos que “atrapalhavam” a sustentação da tese do mensalão, entre eles o laudo 2828. Não só isso. Tudo aquilo que negaram aos réus petistas, concederam aos “tucanos”. E nem falo dos tucanos do mensalão mineiro, e sim dos servidores do BB, nomeados na gestão FHC, arrolados nas mesmas acusações que se imputaram a Pizzolato, réus num inquérito em separado conduzido na 12ª Vara de Brasília: desmembramento (não entraram na Ação Penal 470), julgamento em primeira instância, e direito a uma investigação sigilosa, sem exposição pública.
Quando se descobriu a existência desse inquérito, soube-se também de outra investigação em andamento no STF, de número 2474, para a qual desde o início foram encaminhados documentos, entre eles o Laudo 2828, que poderiam criar um estorvo para a Ação Penal 470. O diálogo entre o PGR e Barbosa (registrado nos autos), tentando explicar porque documentos e réus, referentes aos mesmos crimes que se imputavam a réus da Ação Penal 470, deveriam figurar em inquéritos em separado, entrará para a história como exemplo “supremo” de cinismo judiciário.
Diz Barbosa, em resposta ao pedido do PGR para “desmembrar” o inquérito envolvendo não-petistas e documentos incômodos, no dia 10 de outubro de 2006:
“(…) defiro o pedido para que os (novos) documentos sejam autuados em separado, como (novo) inquérito. …Por razões de ordem prática, (para não) gerar confusão…”
Não gerar confusão… Ou seja, não atrapalhar os planos de dar consistência a uma tese caduca desde a origem, e acusar inocentes.
Outros réus do BB, arrolados na mesma acusação que Pizzolato, ficaram a salvo do linchamento público promovido pela mídia. E os documentos que poderiam trazer obstáculos à condenação dos réus da Ação Penal 470 foram guardados sob o tapete de inquéritos secretos.
Em termos de cinismo e inépcia, contudo, nada pode superar a própria denúncia de Antônio Fernando de Souza, encaminhada ao STF, e aceita pela maioria dos ministros. O PGR afirma que “Pizzolato em atuação orquestrada, desviou vultosas quantias do Fundo de Investimento Visanet, constituído com recursos do Banco do Brasil” e apresenta como principal prova documental uma auditoria feita pelo Banco do Brasil.
A acusação é do tipo barbosiano: contém tantos erros numa só frase que mereceria se tornar um editorial do Globo.
O nome do Fundo não é Fundo de Investimento Visanet. Fundo de Investimento supõe um cabedal com sócios-proprietários. O nome verdadeiro é Fundo de Incentivo Visanet, e os documentos comprovam que pertence exclusivamente à empresa Visanet. A auditoria mencionada cobre o período de 2001 a 2005. Pizzolato foi nomeado apenas em fevereiro de 2003; o petista é também culpabilizado, portanto, por um período (2001 e 2002) no qual sequer trabalhava na diretoria de marketing. Não há nenhuma prova de “ação orquestrada”. Pizzolato não tinha nenhum poder de ingerência sobre os recursos em questão. O cargo de diretor de marketing, na hierarquia do Banco do Brasil, era secundário; e os que tinham alguma influência sobre a gestão do fundo Visanet, que era dinheiro privado, eram outros servidores, não Pizzolato, conforme atesta o laudo 2828, pedido pelo próprio procurador e deferido por Joaquim Barbosa.
Quando encaminha o Laudo 2828 ao STF, já depois que a denúncia havia sido aceita, o procurador mente deslavadamente:
“Em que pese seu teor ser de leitura obrigatória…, alguns trechos do Laudo 2828/2006 merecem destaque, pois confirmam a imputação feita na denúncia de que Pizzolato e Gushiken beneficiaram a empresa de Marcos Valério.”
Mentira. O Laudo 2828 sequer menciona o nome de Pizzolato ou Gushiken.
Como se não bastasse, hoje sabemos que Barbosa, durante o julgamento, cometeu um erro crasso sobre a data da morte de um dos réus. Mais uma prova de sua incompetência e desonestidade. Em sua ânsia de impor a pena mais severa possível a José Dirceu, uma ansiedade indigna de um juiz, Barbosa informou ao plenário que José Martinez, então presidente do PTB, ainda estava vivo em dezembro de 2003; ele havia falecido em setembro. A informação foi aceita e usada para que as penas impostas a Dirceu fossem mais pesadas, visto que, em dezembro de 2003, a legislação brasileira, por orientação de Lula, se tornara mais severa contra a corrupção. E olha que o ministro Marco Aurélio Mello observou, enfaticamente, que a data era importante justamente por causa disso.
Curioso notar que nenhum meio de comunicação, apesar das centenas de repórteres e especialistas diuturnamente analisando e acompanhando o julgamento, que acontecia ao vivo na TV Justiça, identificou o vexame de Barbosa.
Agora, mais que nunca, cresce a convicção de que a população brasileira foi mais uma vez vítima. Promoveu-se, em canais de tv que são concessão pública e que recebem bilhões de reais de publicidade pública, uma mentira ao povo, de que o julgamento seria uma vitória “histórica” contra a corrupção. Foi o contrário. Testemunhamos o maior fiasco da história do STF, uma capitulação vergonhosa ao poder da mídia, ao conservadorismo e a todos os setores derrotados pelo sufrágio popular. O processo conhecido por mensalão foi a oportunidade para se obter uma revanche à vitória eleitoral de Lula em 2002, e para isso arrolaram-se todos os truques, todas as mentiras, todas as armas ainda à disposição do conservadorismo.
Derrotar essa mentira, ou este “mentirão”, conforme bem denominou a corajosa jornalista Hildegard Angel, é uma tarefa coletiva de todos os que lutam por justiça.
A corrupção tem de ser combatida duramente, e temos que aprimorar constantemente nossos hábitos políticos, mas jamais conseguiremos isso condenando inocentes e chancelando farsas.
http://www.ocafezinho.com/2013/06/05/o-maior-fiasco-do-seculo/
Capítulo 9 - O papel da mídia
O papel da mídia
Uma das virtudes fundamentais no espírito de um jornalista é a ojeriza a teorias de conspiração. É uma virtude, no entanto, que beira um vício, porque o mesmo pensamento racional, a mesma objetividade, que nos aconselha a manter distância de discursos paranóicos e teorias de conspiração, nos obriga a aceitá-los quando estamos diante de documentos e provas irrefutáveis.
A divulgação de milhares de documentos secretos da diplomacia norte-americana, pelo Weakleaks, consistiu, por exemplo, numa inesquecível vitória moral para milhares de pessoas que acusavam, há décadas, os EUA de promoverem golpes de Estado em países do terceiro mundo. Na época, um divertido argumento fez sucesso nas redes sociais: “sabe aqueles malucos que viviam culpando a CIA por tudo? Estavam certos.”
A bem da verdade, não foi apenas o Weakleaks. Algumas leis que obrigam a divulgação de documentos do governo americano com mais de trinta ou quartenta anos, também ajudaram.
Mas ser jornalista não é dizer a verdade. Essa é a função, talvez, de filósofos. Jornalistas divulgam documentos e fatos concretos, e a verdade que buscam é apenas aquela que podem comprovar com base neles. O uso da lógica, porém, não é vetado aos jornalistas. Nem a imaginação, desde que usada com parcimônia.
No processo do mensalão, todavia, a imaginação se tornou a virtude fundamental do jornalismo político. Reportagens, colunas, análises, passaram a se descolar cada vez mais de qualquer prurido factual e inagurou-se uma nova era quase psicodélica na imprensa brasileira. Teorias eram montadas e desmontadas sem qualquer escrúpulo. O fato de inúmeras denúncias serem desmentidas no dia seguinte não tinha mais importância. Um clima de total liberdade de expressão enfim se instalara nas redações nacionais.
Quando os historiadores se debruçarem, daqui a alguns anos, sobre o mensalão, o tradicional rigor acadêmico possivelmente lhes obrigue a dividir o tema em várias seções: política, mídia, partidária, jurídica.
Em meu modesto esforço para escrever sobre um caso ainda em curso, e portanto ainda influenciado pelo clima barra pesada, sufocante, de tribunal, estamos tateando em todas as áreas, mas a corda que uso para não cair são documentos. Por isso tenho sido repetitivo quanto ao caso Pizzolato. É que me parece o caso mais surreal, kafkiano e… documentado. A sua inocência é documentada.
Se a grande mídia fizesse uma ampla reportagem sobre os erros na condenação de Pizzolato, mostrando os documentos, apresentando-os a juristas conceituados e pedindo sua opinião, testemunharíamos uma sumária desmoralização da Ação Penal 470. Aliás nota-se hoje um barulhentíssimo silêncio nos grandes jornais e nas redes de TV sobre o debate tão aceso nas redes sociais e blogs, sobre os erros do STF. A ruptura da mídia com a sociedade se tornou completa. O artigo da Inês Nassif, por exemplo, abordando a suja história do Laudo 2828, que inocenta Pizzolato, tornou-se imediatamente o mais lido em todos os principais blogs políticos no país, mas o assunto é virtualmente proibido na grande imprensa. A mesma coisa vale para o erro crasso de Barbosa quanto a data da morte de José Martinez.
A nossa presidenta gosta de repetir o clichê supostamente pró-democrático, sobre preferir o barulho da imprensa ao silêncio da ditadura. É uma frase bonita, mas a verdade é que o único barulho que a imprensa quer ouvir, no caso do mensalão, é o da tampa de um caixão se fechando. A nossa mídia não é boba. O espaço à divergência se dá apenas em questões não estratégicas. E o mensalão é um assunto absolutamente estratégico para os grandes grupos de mídia, que se tornaram, assumidamente, o grande partido do conservadorismo brasileiro.
Entretanto, mesmo durante o julgamento, quando o assunto ocupava, diariamente, várias páginas de jornal, e hegemonizava o noticiário televisivo, havia muitos mais fogos de artifício do que conteúdo. Não havia um debate sério sobre o tema. O tal “barulho da imprensa”, tão ao gosto da nossa chefe de Estado, era apenas um ruflar histérico dos tambores da oposição. Os réus, porém, não eram só aqueles perfilados na denúncia da Ação Penal 470, mas toda a sociedade, incluindo os elementos raivosos que pagavam anúncios no Facebook para promover páginas repletas de indizível rancor. Todos são vítimas do maior processo de manipulação da informação de que temos notícia.
O mensalão foi o canto do cisne da grande mídia brasileira. O escândalo é deflagrado exatamente no momento em que a internet ainda não havia sido “apropriada” pela sociedade. Os únicos blogs políticos estavam em mão da grande mídia de oposição: Noblat e Reinaldo Azevedo. A imensa ágora pública, caótica e democrática em que se tornou a internet brasileira não havia se constituído nos anos de 2005 e 2006. A imprensa reinava sozinha. Se hoje ela ainda tem um poder descomunal para influenciar o espírito nacional, naquela época esse poder era quase absoluto.
Uma das seções mais importantes no estudo do processo do mensalão, portanto, é o papel desempenhado pela mídia. É um papel que ainda está sendo desempenhado. Hoje, sexta-feira 07 de junho, uma notícia deixou inteiramente perplexos a grande nação de internautas: o único jornalista convidado pelo ministro Luiz Fux para dar uma “aula pública” aos ministros do STF sobre financiamento de campanha será Merval Pereira, colunista e membro do conselho editorial do jornal O Globo.
A promiscuidade entre a grande mídia, em particular a Rede Globo, e o STF, parece não encontrar limites. Até mesmo os juízes mais resistentes à pressão da mídia, como Lewandovski, ligavam para Merval, no dia seguinte a sessões, para “explicar” seus votos. Joaquim Barbosa, por sua vez, liga regularmente para Merval para justificar algum de seus destemperos.
E Ayres Britto escreveu o prefácio do livro de Merval Pereira sobre o mensalão enquanto ainda era presidente do Supremo Tribunal Federal (STF)!
Se a mídia é um poder terrível em qualquer parte do mundo, uma concentração absoluta numa só empresa empresta-lhe um ar perigosamente antidemocrático.
A maior parte da “pressão social” alardeada pela grande mídia, e usada pelos próprios ministros do STF como justificativa para a incrível criatividade com que se portaram no julgamento da Ação Penal 470, a ponto de ser qualificado, de maneira promissoramente corajosa pelo mais novo ministro, Luís Roberto Barroso, de “um ponto fora da curva”, veio da Rede Globo. Com toda certeza, os ministros se portavam no tribunal com um olho não na população brasileira, não na História, mas em como seriam caricaturizados no Globo no dia seguinte. As notinhas de Ancelmo Gois sobre Joaquim Barbosa, alardeando sessões de aplauso no metrô de Ipanema e shows da Marisa Monte, e mencionando, orgulhosamente, a criação de um site para lançar a candidatura presidencial de Joaquim Barbosa, parecem ter surtido um efeito narcótico poderoso no espírito de todos os juízes. Da mesma maneira, a mesma mídia incitava agressões verbais ou mesmo físicas contra Lewandosvki, único ministro que ousou se contrapor, e mesmo assim timidamente, à agressividade inacreditável de Joaquim Barbosa.
No início do texto, eu falava na ojeriza à teorias de conspiração com importante virtude jornalística. Mencionei também que esta virtude pode se tornar um vício se nos recusamos, mesmo diante de evidências, em aceitar a existência de uma conspiração. O que vimos no processo do mensalão nos traz esse dilema. Todos os fatos, documentos, ações, discursos e posturas, apontam para uma conspirata política. Uma conspirata da qual participaram os dois procuradores gerais da república, Joaquim Barbosa, a oposição, a mídia. O próprio governo, vergado, intimidado, aterrorizado com a possibilidade de um golpe, talvez tenha pactuado, em parte, com tudo isso, sacrificando seus próprios companheiros em prol da sobrevivência. Enfim, estamos diante de um jogo político extremamente barra-pesada.
Mesmo com evidências, porém, este é um terreno que devemos trilhar com cuidado. Não podemos largar a corda que nos impede de cair no abismo. O mensalão ainda é uma história cheia de segredos, desagradáveis para todos os lados. É um processo e um julgamento ainda em curso. No próximo capítulo, faremos algumas incursões na seara propriamente política da nossa história, comentando seus desdobramentos presentes e futuros.
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Capítulo 4 - Tirem as crianças da sala
Enviado por Miguel do Rosário on 16/05/2013 – 5:20 am
A história de uma farsa – Capítulo 4
“A compra de apoio político”.
Na verdade, o famigerado mensalão correspondeu a duas necessidades de caixa. A primeira foram as dívidas da campanha de 2002. A segunda, a necessidade de investir nas eleições de 2004 e integrar estratégias eleitorais de legendas coligadas. Ué, “integrar estratégias”, ao supor partilhamento de recursos, não seria comprar apoio político? Então o STF está certo? Não. Não está certo porque a acusação do STF não é, exatamente, “compra” de apoio político, que é uma coisa genérica, difícil de ser mensurada. Os ministros acusaram o governo de comprar a consciência dos deputados, em votações específicas, e tal acusação só poderia ser feita mediante a existência de uma confissão. O que não houve. A única confissão de compra de voto, que eu me lembre, é do Ronivon Santiago (PFL-AC), que acusou o governo FHC de organizar pagamentos de 200 mil para que os parlamentares votassem em favor da emenda da reeleição.
Consolidar apoio político não é crime. O que move os grupos políticos são os interesses econômicos. Se eu dou três ministérios para um partido, estou “comprando” seu apoio político. Se distribuo tantos cargos para os quadros daquele outro, idem. Se integro financeiramente campanhas entre partidos aliados, a mesma coisa. Algumas dessas coisas podem configurar irregularidades ou uso de recursos não-contabilizados, mas o crime não é a questão política, visto que a construção de alianças em prol da governabilidade é um pressuposto necessário para estabilidade institucional.
Os R$ 6 bilhões que a Secom deu à Globo nos últimos 10 anos não configuram “compra de apoio político”? Nomear tucanos para chefiar a Procuradoria Geral da República, por exemplo, foram operações quase suicidas de Lula para “comprar” apoio político…
O crime que existiu é o caixa 2. O crime é dar dinheiro ilegalmente a uma liderança partidária. Mas então que as condenações sejam para o crime de caixa 2 e para o crime de lavagem de dinheiro e corrupção. A acusação de compras em massa de consciências só seria possível se as mentes dos parlamentares “comprados” fossem dissecadas em laboratório e ficasse provado que eles votaram porque, e só porque, receberam uma quantia para isso. Essa é a grande falha da acusação, agravada pelo fato de que os que receberam dinheiro para “votar” com o governo, já pertenciam à base aliada. Alguns eram do próprio PT!
Mas voltaremos mais tarde aos erros do STF, que são muitos e terríveis. Agora vamos nos alongar um pouco mais sobre realpolitik. Tirem as crianças da sala, por favor.
Será que foi por isso, por exemplo, que o PT também “comprou” apoio político do PSDB? O grupo de Gushiken e Palocci cedeu várias estruturas importantes aos tucanos, em troca de apoio político no parlamento. O Banco do Brasil, o Banco Central, os fundos de pensão. Tudo relacionado a Palocci e a Gushiken foi entregue e/ou permaneceu com os tucanos.
Esse foi um debate duro que se deu bem “no seio” do governo, diz o ex-diretor de marketing do Banco do Brasil, que observou essa disputa durante a campanha – embora jamais tenha ocupado nenhum cargo de direção no partido. A decisão contou com a oposição dura de José Dirceu. “O Zé era radicalmente contra isso, e ameaçou fazer convenção e ganhar lá. Ele argumentava que os tucanos já estavam há muito tempo no governo e tinham aparelhado tudo. Se continuassem ocupando funções-chave, seria como se continuassem no poder.” Dirceu defendia uma grande aliança com o PMDB, enquanto Lula via mais vantagem em se aliar aos pequenos partidos, mantendo parcerias pontuais com o PMDB.
Delúbio chegou na primeira reunião após a vitória confiante de que seria elogiado pela vitória eleitoral e pela bem sucedida prestação das contas da campanha nacional junto ao STE. Quando recebeu a ordem de resolver um pepino de algumas dezenas de milhões de reais, referentes às dívidas dos diretórios regionais, quase pulou da janela.
“Lula tentava acalmá-lo. Está tudo bem, Delúbio. Tudo bem. É melhor a gente assumir isso do que correr o risco dessa gente fazer bobagem”, conta Pizzolato, presente à reunião.
“Quando eu fui para a campanha, a coordenação me disse: precisamos de um cara para plano de governo, para explicar isso e aquilo. Ainda durante a campanha, o Delúbio me chama e diz: estamos no negativo”.
Delúbio diz a Pizzolato que o partido precisava de R$ 1,5 milhão para capital de giro. Quem botava a mão na massa e trabalhava pra valer era o assessor de Delúbio, Paulo Martins, que depois virou chefe de gabinete do Okamoto. O Delúbio só assinava os papeis, fumando charutos. Pizzolato procedeu ao rito normal de qualquer cliente e entrou em contato com o Banco do Brasil, para marcar uma entrevista e ver o quanto o partido podia pegar emprestado junto à instituição. As regras eram rígidas, e o PT só conseguiu pegar exatamente R$ 1,6 milhão, dando como garantia o próprio fundo partidário.
Finda a campanha, todos sabiam que havia dívidas. Lula orienta o tesoureiro do partido a assumir as dívidas regionais; começa a via sacra. Cada estado apresenta a relação das dívidas.
Hoje se sabe que foi naquele momento que surge Marcos Valério. Com Valério como avalista, o PT consegue um limite maior: R$ 3 milhões junto ao Banco Rural. Mas ainda faltava muita coisa. Então Valério disse que podia “quebrar o galho”, e pegou empréstimos mais vultosos em seu nome. Sua intenção, naturalmente, era ter o PT lhe devendo favores, e fazer com que isso representasse, no futuro, uma gorda conta estatal; essa era a a especialidade de Valério na DNA: fazer lobby junto a governos e grandes empresários, e conseguir contas.
*
A DNA já tinha contratos com o BB antes dessa história dos empréstimos. O primeiro contrato da DNA com o BB data de 1994. “A empresa vinha ganhando muitos prêmios importantes, estava incomodando as grandes agências de São Paulo”, observa Pizzolato.
*
Alexandre Teixeira, autor do blog Megacidadania e pioneiro de um movimento em defesa da anulação da Ação Penal 470, observa que a Receita Federal investigou 25 anos da vida de Pizzolato, e não encontrou nada.
Perguntei-lhe então sobre os 320 mil reais que foram sacados num escritório do banco rural, no Rio. A versão de Pizzolato é que não sabia que se tratava de dinheiro. Disse que atendeu um telefonema de uma pessoa que se identificou como secretária da DNA e solicitou-lhe que fosse buscar documentos em um determinado endereço. Pizzolato solicitou à secretária da PREVI que um contínuo fosse buscá-los. Eram dois envelopes, que foram entregues, segundo ele, algumas horas depois a um emissário do PT. Ele disse que achava que deveria ser material de campanha, porque já tinha informação que DNA abrira uma empresa de marketing político, e queria trabalhar na campanha do PT. Em depoimento judicial, Valério disse que o diretório do PT do estado do Rio de Janeiro, de acordo com o então tesoureiro do PT, Delúbio Soares, tinha débitos de campanha de 2002, estava se preparando para as eleições municipais de 2004. O tesoureiro do PT, então, solicitou a ele (Valério) que remetesse um total de R$ 2.676.660,67 ao PT do Rio de Janeiro. As pessoas indicadas para o recebimento foram Manuel Severino, Carlos Manuel e Pizzolato, disse Valério. Os R$ 326.660,67 repassados via Pizzolato seriam parte desse total.
Importante recordar que um notório tucano, o publicitário Nizan Guanaes, estava em tratativas para fazer a campanha petista na capital do Rio.
Pizzolato, condenado por supostamente “desviar” recursos da Visanet (ainda voltaremos uma última vez a este caso), explica que a CPMI dos Correios, que investigava o mensalão, não tinha incluído a questão da Visanet. As investigações vinham descobrindo, segundo consta no relatório final da CPMI, casos bem maiores de caixa 2, pegando todos os partidos. “Aquilo ia revirar a república pelo avesso. A Visanet era uma coisa mais neutra”. A oposição pensou que Valério estava fazendo para os petistas o mesmo que havia feito para eles, que era receber uma quantia superfaturada para realizar um evento. O que explicaria a mira afiada em Valério e nos contratos de publicidade da DNA com a Visanet e Banco do Brasil. Só que as campanhas da DNA junto à Visanet/BB foram realizadas. O “mensalão” não passou pela Visanet, nem pelo BB, e sim pelo esquema de empréstimos tomados por Valério junto a alguns bancos para sanar os problemas financeiros do PT.
Hoje há confirmação que Daniel Dantas, o jovem prodígio que ficou bilionário na era FHC, era um dos principais clientes de Marcos Valério. Sua eventual participação no abastecimento do valerioduto, no entanto, jamais foi explorada pela grande imprensa. Ele até chegou a depor numa CPI, mas numa audiência a portas fechadas; a acusação contra Pizzolato e Visanet foi seu biombo perfeito. Detalhe: Pizzolato é o único dirigente do BB processado por Daniel Dantas, porque enquanto representante dos funcionários do BB na Previ, e como tal membro do Conselho da Brasil Telecom (empresa controlada por Dantas), Pizzolato proferiu um voto que desagradou o poderoso banqueiro, que imediatamente ordenou sua exclusão do Conselho. O petista pode integrar, portanto, a seleta lista do jornalista Paulo Henrique Amorim, com os processados por Dantas.
Como vocês podem constatar, tento retratar fielmente os acontecimentos, sem poupar ninguém. Entretanto, nenhum erro superará os cometidos pela Procuradoria e pelo STF, alguns dos quais irei discutir e denunciar no próximo capítulo.
Capítulo 5 - As bombas aqui dentro
Enviado por Miguel do Rosário on 18/05/2013 – 2:40 pm
A história de uma farsa – Capítulo 5
Reflexões sobre a Bastilha mental
Dessa vez eu senti a vertigem. Escrever sobre um tema tão explosivo, aproximar-se de pessoas que vivem até hoje dentro de uma usina nuclear cheia de vazamentos, me deu a sensação de estar no topo de um edifício em chamas, olhando o abismo lá embaixo.
Ou então parece que adentramos um ambiente altamente inflamável, mas escuro e acendemos um fósforo para poder olhar ao redor. A intenção é boa, mas o risco, altíssimo. As bombas não explodem apenas lá fora, como eu disse; há estilhaços que entram pela janela e podem nos atingir. A Procuradoria Geral, alguns ministros do STF e setores da imprensa tornaram-se, definitivamente, agentes políticos sem qualquer escrúpulo, e provaram desfrutar de um poder sinistro: podem colher qualquer história, inclusive textos nossos, e transformá-la em qualquer coisa. Daí o perigo, eles tem o poder de criar a mentira e condenar com base naquela mentira.
Sobretudo ainda vivemos aquele clima pesado de tribunal, em que tudo que dissermos pode se voltar contra nós. Agora sim entendi porque se precisa de distanciamento histórico para se analisar uma situação com serenidade.
Vamos esclarecer algumas coisas sobre o texto anterior. Tragam as crianças de volta para sala; eu errei ao pedir que elas saíssem. Elas têm que aprender desde cedo algumas lições de vida.
O julgamento do mensalão foi viciado e condenou inocentes. A denúncia da procuradoria foi inepta. Disso eu já sabia, porque acompanhei todo o processo, escrevi sobre ele. Não digo que os réus são inocentes de qualquer coisa. O direito moderno, desde o Iluminismo, após séculos de trevas jurídicas, entende que um processo legal deve condenar ou absolver as pessoas em relação aos crimes que estão sendo julgados. Senão vira, como virou, um linchamento. Insufla-se um ódio tão grande nas pessoas contra a política, contra o governo, contra o partido dos trabalhadores, que a culpabilidade ou não dos réus passa a ser um mero detalhe. É como se eles tivessem que expiar a culpa por toda a podridão da política brasileira dos últimos duzentos anos.
A minha experiência nova, meio que assustadora, foi conhecer pessoalmente algumas vítimas desse linchamento. Em Vigiar e Punir, Foucault descreve as torturas físicas da idade média e analisa o desenvolvimento dessa tara inominável, que é o prazer pelo sofrimento do outro. Logo no início do livro, há uma descrição pavorosamente minuciosa do esquartejamento vivo de um condenado. É uma coisa absurda; perguntamo-nos o tempo inteiro qual o objetivo daquilo?
Hoje a mesma técnica é utilizada, mas no campo psicológico. A tortura moral que a mídia pode inflingir a um indivíduo e à sua família, ao envolvê-lo num processo político, é algo terrivelmente chocante. É chocante inclusive se ele for culpado, porque inventa-se uma forma de punição que não está prevista no código penal. Existe o mundo das leis, onde as pessoas são condenadas estritamente pelo que fizeram, e a punição vem rigorosamente prevista em acordo com a Constituição. As punições morais operam num outro universo, não regido pelos códigos escritos, mas por leis às vezes muito mais severas, porque milenares. Recentemente, um pai “esqueceu” o filho recém-nascido dentro do carro por algumas horas, e o menino morreu. O pai é culpado. Ninguém nega sua imperdoável irresponsabilidade. Mas o juiz entendeu que a culpa que esse pai teria que carregar por toda a vida já era tão terrível que não precisava sequer ir preso. O homem estava internado há dias, em estado de choque, depois de tentar o suicídio. Não imagino nenhum sofrimento maior do que o remorso de matar, sem querer, o próprio filho! Mesmo sabendo que ele é culpado, mesmo tendo raiva do homem, não consigo deixar de sentir um pouco de compaixão. Imagine então aplicar o mesmo tipo de punição moral a um inocente?
Com a transformação do mundo num espaço totalmente midiatizado, o poder da punição moral, via exposição pública, atingiu um ponto crítico. A expressão “assassinato de reputação”, muito usada nos últimos anos para descrever o processo de denúncias, muitas vezes sem substância, contra adversários políticos, não diz tudo. Não apenas se mata a reputação. Faz-se uma coisa tremendamente pior. Tortura-se, lentamente, cruelmente, sadicamente.
É isso o que Genoíno tem repetido, sempre que há um movimento como que de abutres a seu redor, tentando bicar mais um pedacinho de seu fígado: fui barbaramente torturado na ditadura, mas o que têm feito comigo agora ainda é pior.
Se a coisa é chocante quando se trata de culpados por algum crime, obviamente é muito mais quando estamos diante de um inocente. Quando é alguém distante de seu universo, você simplesmente se afasta, como quem decide não assistir a determinado filme de terror. Mas acontece às vezes de você topar com uma vítima. Falar com ela. Comer uma pizza e tomar um guaraná com ela. Então todo o esforço que você fazia para afastar a sua imaginação do tipo de tortura mental que a mídia pode inflingir a uma pessoa inocente vai por água abaixo.
Isso foi o que mais me marcou.
Eu sempre fiz uma defesa do Lula e do PT porque entendia um e outro como agentes do nosso desenvolvimento e da nossa libertação social. Se defendi ambos no momento mais crítico, quando simplesmente não sabíamos o que havia acontecido, agora que temos uma noção melhor das coisas, minha defesa é ainda mais tranquila e mais enfática. No capítulo anterior, eu descrevi de maneira superficial o processo de construção da governabilidade. Não dá para fazer um tratado sobre poder, democracia, governabilidade, ética, moral e compromisso social em dois parágrafos. Estes são temas que espero desenvolver melhor mais tarde.
O novo grau de circulação das informações está nos levando a um outro estágio: estamos saindo de um tempo em que havia as coisas que podiam ser ditas, e as coisas que não podiam ser ditas. Wikileaks, leis de transparência pública, internet, o mundo político hoje está um bocado perplexo com a nova situação, em todos os países. Há uma aflição constante no ar.
No Brasil, em particular, a situação chegou onde chegou porque a chamada opinião pública, a verdadeira, não a de meia dúzia de colunistas, é refém de um processo que começou lá em 1964. Começou até antes, na década de 50, mas somente em 1964 a mídia, esta mídia, conseguiu se tornar hegemônica. Qualquer outra opinião era criminalizada e, literalmente, morta. Durante mais de 20 anos, somente os barões pontificavam sobre política, e roubou-se da sociedade brasileira não apenas o que ela tinha de mais precioso, o direito de se expressar livremente, mas as consequências positivas dessa liberdade: entender melhor a nós mesmos e a maneira de nos governarmos; entender melhor a democracia, suas contradições e problemas.
Após a ditadura, a situação perdurou porque os desdobramentos iniciados no regime militar continuaram acontecendo. O ambiente de profunda crise econômica, por si só, mata a liberdade, de uma outra forma, pelo bolso. Assistimos a uma ou duas gerações de jornalistas, cineastas, escritores, intelectuais, que tinham algum pendor pela independência, e que podiam efetivamente contribuir com uma voz diferente, para termos no Brasil um debate político mais plural e mais avançado, assistimos a estas gerações se perderem na miséria econômica, na desesperança, na adversidade.
Com o PSDB no poder, atingimos o apogeu da corrupção moral. O Brasil jamais debateu suficientemente o problema político causado pela decisão de FHC de aprovar uma emenda para reeleger a si mesmo. A gente discutiu por anos a reeleição de Chávez, jamais a de nosso próprio presidente. Jamais discutimos as implicações morais disso, nem o obscuro processo para construir a maioria parlamentar naquela votação. Chávez fez um plesbicisto popular. Consultou diretamente o povo. O governo FHC aprovou a reeleição através de uma suja negociata palaciana.
Daí a sociedade brasileira nunca teve uma noção aproximada de como funciona o processo político. De repente, com o escândalo do mensalão, há um esforço massivo, deliberado, maquiavélico, covarde, de pegar uma sociedade fragilizada por décadas de desinformação e manipular todos os seus preconceitos em relação a política e a democracia, em prol de derrotar um projeto. Quando se abriram as cortinas dos bastidores da democracia, e vimos as lideranças partidárias fazendo acordos para se eleger, governar, pagar enormes dívidas de campanha, setores políticos viram a oportunidade de ludibriar a população com um discurso hipócrita: vejam só, que vergonha! nós nunca fizemos isso!
Não é verdade. Fizeram muito pior. E fazem algo infinitamente mais podre, repetindo exatamente o que fizeram durante as campanhas udenistas: criminalizam a política e desqualificam a democracia. Pintaram Vargas como um bandido porque o Banco do Brasil emprestou dinheiro para Samuel Wainer criar a Última Hora, quando todos os presidentes anteriores haviam emprestado quantias ainda maiores para O Globo, para o Correio da Manhã e para os jornais de São Paulo. E agora criminalizam o PT. Não ficaram satisfeitos com o mea culpa do partido por ter feito caixa 2. Inventaram uma trama diabólica, sem base em nenhuma prova, para causar o maior dano político e humano possível no partido e em tudo que ele representa.
Eu já tinha compreendido essa questão política. Mas agora, conhecendo Genoíno e Pizzolato, eu passei a ver as coisas por um outro ângulo. Passei a ver as coisas numa perspectiva humanista. De repente, tudo o mais se apagou, e eu vi uma figura humana com braços e pernas em xis, como naquele desenho de Da Vinci.
Há tanta injustiça no mundo, no país, crianças drogadas na rua, o sistema de saúde pública é precário, mas de repente o que mais nos choca é a injustiça contra o ser humano à nossa frente. Esquecemos a política, a ideologia, os partidos, a democracia, tudo é posto de lado quando se está diante de uma arbitrariedade.
Justamente por isso, essa pode ser a chave para a gente reverter essa tremenda injustiça. O caso Pizzolato, em particular, detêm a chave para se anular a Ação Penal 470. Não sou apenas eu que enxergou isso. Raimundo Pereira, editor da Retrato do Brasil, farejou algo semelhante. Não à tôa dedicou edições inteiras de sua revista aos erros da procuradoria e do STF no caso Pizzolato. Outros jornalistas agora estão abrindo o olho.
Num dos capítulos atrás, eu mencionei a obra-prima de Jules Michelet sobre a revolução francesa. Lembrei-me agora de outro fato que nos faz pensar naquele mito do eterno retorno. As coisas vão se repetindo o tempo inteiro, o que é bom, porque nos dá chance de aprendermos e lidarmos com os monstros de maneira mais experiente. Algumas da páginas mais belas que já li em minha vida são aquelas em que Michelet descreve o processo que culminou na Tomada da Bastilha, esse evento que marca o início de uma nova era no mundo.
A Tomada da Bastilha não nasceu da estratégia de lideranças políticas. Segundo Michelet, foi um explosão espontânea, desorganizada, popular. A multidão acorreu, furiosa, desesperada, na direção daquela fortaleza que simbolizava os aspectos mais tenebrosos do regime monárquico. Como prova da espontaneidade da rebelião, Michelet descreve a enorme quantidade de mulheres, velhos e crianças que participavam.
Qualquer pessoa podia ser presa e encarcerada na Bastilha. Até burgueses e aristocratas podiam ser vítimas. Um caso comum, por exemplo, era uma mulher, mancomunada com um amante, denunciar o próprio marido, para poder usufruir livremente de seus bens. O marido apodrecia incomunicável na Bastilha pelo resto da vida.
Michelet descreve como tudo começou. Entre os fatos que levaram ao desenvolvimento de um ódio tão intenso dos franceses à Bastilha está justamente uma mulher. Uma mulher simples, do povo, que achou uma carta de um homem que jazia há muitos anos na prisão, por um crime que, segundo ele, não havia cometido.
Por trás dos grandes acontecimentos da revolução francesa, escreve Michelet, jamais poderemos esquecer este caso, que ajudou a derribar os pilares morais nos quais se assentava o regime. Ao conhecer Pizzolato e estudar seu caso, eu me senti um pouco como aquela senhora do livro de Michelet.
A senhora não tinha pretensões de derrubar o regime. Ela sentiu-se tomada por uma compaixão profunda por aquele homem, e passou a procurar as autoridades para que avaliassem o caso. Acabou ganhando notoriedade. Foi ameaçada, ridicularizada, agredida. Mas prosseguiu. Michelet não sabe o que aconteceu a esta mulher, nem ao prisioneiro. Nas semanas seguintes, o Antigo Regime ruiu. Quando o povo tomou a Bastilha e abriu os portões, libertando todos os prisioneiros, houve um momento de grande júbilo. O povo abraçava, chorando, aqueles homens que permaneceram anos esquecidos do mundo, largados numa masmorra, incomunicáveis. Havia centenas de bastilhas em toda França. Elas representavam o absolutismo, o poder que o Estado tinha para inflingir o pior de todos os sofrimentos a um indivíduo: acusá-lo das piores barbaridades, sem lhe dar a chance de se defender.
Quando eu conheci Pizzolato e sua esposa, eu pensei: temos um cidadão brasileiro e sua família sendo torturados numa bastilha ainda pior que aquela do Antigo Regime, porque é uma bastilha mental. Ao mesmo tempo entendi que o caso Pizzolato pode ser a chave para deflagrar uma reviravolta definitiva na farsa que setores políticos e mídia armaram para aplicar um golpe 2.0 na sociedade brasileira. Essa farsa vai se voltar contra os que a praticaram. Vamos tomar essa Bastilha.
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Capítulo 6 - A História não anda de avião
Enviado por Miguel do Rosário on 25/05/2013 – 4:10 pm
A história de uma farsa – Capítulo 6
Homenagem a um jornalista
Outrora se falava que “ainda existem juízes em Berlim”, referindo-se aos derradeiros magistrados que resistiram à sanha nazista e defenderam princípios constitucionais numa Alemanha mergulhada em profunda crise. Que grande ironia assistir, num Brasil que vive o apogeu de sua democracia e goza de sólida estabilidade econômica, a inversão dessa frase. Não existem mais juízes em Brasília? Essa pergunta ainda está no ar, visto que há um fiapo de esperança de vermos o STF evitar a desmoralização de se render às forças do atraso e à arbitrariedade. Mas a frase vale para uma outra atividade crucial quando se discute este processo político e judiciário conhecido por “mensalão”. Ainda existem jornalistas no Brasil? Felizmente, sim. Endereço a frase especialmente para o editor da revista Retrato do Brasil, Raimundo Pereira, que realizou um trabalho criterioso e completo para descontruir as mentiras contidas na denúncia da Ação Penal 470.
Se durante o julgamento, as matérias de Pereira fossem publicadas num jornal de grande circulação e seu conteúdo fosse adaptado para a televisão, outro seria o destino dos réus, e poderíamos testemunhar um outro debate, bem mais consequente. Estaríamos agora discutindo, de maneira mais objetiva, um fato gravíssimo: a construção de uma conspirata política para derrubar um governo eleito, ao arrepio de inúmeros direitos constitucionais consagrados. A procuradoria e alguns ministros lançaram cidadãos na fogueira da vergonha pública apenas para provar uma tese pré-montada.
Relendo a Edição Especial da Retrato do Brasil, cuja manchete é “A Construção do Mensalão”, e a edição número 65, intitulada “A Prova do erro do STF”, senti o alívio de constatar que parte do trabalho que eu me dispunha a fazer, já está pronto, o que me deixa um caminho aberto para passar à etapa seguinte, a análise das consequências. O material coletado por Pereira derruba as teorias centrais da denúncia da Procuradoria. A demolição que faz no caso Visanet, inclusive publicando os documentos que os juízes se recusaram a ver, é particularmente arrasadora. Não sobra pedra sobre pedra.
Consulte o site www.retratodobrasil.com.br, ou ligue para 11-3814 9030 para solicitar as edições que tratam da Ação Penal 470.
Pereira faz o serviço que caberia a um juiz honrado: inocenta Henrique Pizzolato consultando os documentos apresentados pelo próprio réu à acusação. E ainda envereda por um caminho que eu também procurei trilhar nessa história: o aspecto humano. É um aspecto essencial porque nos faz pôr de lado, por um momento, as paixões políticas.
Perdoem-me insistir tanto na figura de Pizzolato. Não sou advogado dele, não temos nenhum acordo pecuniário. Minha insistência se dá por várias razões. Primeiro, por praticidade. Ele mora perto da minha casa, é uma figura de fácil acesso, e sua vida familiar hoje tem apenas um objetivo: provar sua inocência; com toda a calma e convicção, conta o que aconteceu, mostra os documentos, esclarece e procura nos olhos do interlocutor uma explicação plausível para a arbitrariedade terrível que lhe esmagou.
Segundo, por razões de afinidade: Pizzolato não é uma celebridade, como José Dirceu, cercado de fãs e frenesi militante. É um indivíduo pacato, de hábitos extremamente simples. Seria um pouco inexato chamá-lo de “um homem comum”, porque não é fácil encontrar gente com uma história tão bonita. Uma história de conquistas, luta política, grandes sonhos. Foi o primeiro diretor sindical eleito para cargo de representação funcional na administração do Banco do Brasil. Foi um dos articuladores, junto ao Banco, da campanha contra a fome idealizada por Betinho, junto do qual viajou todo o país, iniciativa que abriria caminho para Lula mais tarde fazer suas caravanas da cidadania. Na campanha de 2002, idealizou os kits de apoio a Lula para a Classe A, as famosas estrelinhas douradas, que tanto ajudaram a quebrar o preconceito das elites contra o PT. Como diretor de marketing do BB, levou a cabo várias inovações, muitas das quais hoje passaram por retrocesso; e tinha planos de fazer inúmeras outras, que poderiam trazer benefícios à instituição e ao país.
Terceiro, porque derrubando a acusação contra Pizzolato, desmonta-se um dos suportes cruciais da Ação Penal 470, o uso de dinheiro público no mensalão, que serviu à Procuradoria e ao STF para rechaçar a tese da defesa, de que os volumes movimentados corresponderiam a um caixa 2 de campanha eleitoral.
A principal razão, sobretudo, do meu interesse na figura de Pizzolato é que sua condenação (e o linchamento moral que sofreu, ainda mais severo) simboliza o caso mais chocante de arbitrariedade que já testemunhei. Me fez pensar inclusive na diferença entre injustiça e arbitrariedade.
Uma coisa é a injustiça, para o qual sempre concorrem as agruras do destino e cujas responsabilidades se diluem por todo o corpo social e pelo tempo histórico. Uma criança famélica vagando nas ruas da nossa cidade é culpa de todos nós, é culpa da nossa história, mas justamente por essa culpa distribuir-se tanto, ela perde força em nossa consciência. Viramos o rosto e seguimos em frente. Não podemos consertar tudo.
Uma arbitrariedade é diferente. Não é, como a injustiça, uma consequência de vícios históricos; ela tem um rosto ou vários rostos, e emerge de um ambiente de violência extrema, no caso a violência covarde dos estamentos conservadores da sociedade (mídia corporativa, certa elite aristocrática do funcionalismo, setores raivosos da classe média) contra um ou mais indivíduos, sem lhe dar chance de se defender.
Eu me recuso a aceitar ser responsável pela arbitrariedade cometida contra Pizzolato; sinto-me, ao contrário, também uma vítima. Sinto-me vulnerável. O que aconteceu a ele poderia acontecer a qualquer um. Claro, o fato de ser petista e ter lutado, a vida inteira, por justiça social, ajuda a virar alvo.
Não é uma arbitrariedade que se poderia atribuir a uma confusão judiciária. Tanto os procuradores quanto Joaquim Barbosa, que desde o início tinham acesso aos documentos, dispunham de provas que o inocentavam completamente. Não só ignoraram essas provas. Ocultaram-nas! Isso é o mais chocante. Documentos fundamentais para se esclarecer a relação entre BB, Visanet e DNA foram simplesmente escondidos embaixo do tapete pela procuradoria – e igualmente ignorados por Joaquim Barbosa. Destacamos, principalmente, os pareceres jurídicos do BB em relação à Visanet e o Regulamento do Fundo de Marketing, da própria Visanet (de 2001), que derrubam a tese de que os recursos eram do BB; e o Laudo 2828, que inocenta Pizzolato.
Se falássemos de uma comarca do interior, sempre poderíamos esperar que Pizzolato, que não tem direito a fóro privilegiado, poderia apelar para uma segunda instância, ou seja, para o Supremo. Mas não. Ele foi lançado diretamente para o último círculo do inferno, sem esperança de redenção!
Temos, portanto, uma situação de absoluta ironia. O julgamento vendido à sociedade como uma vitória da ética sobre a política foi, na verdade, um espetáculo grotesco de desonestidade, tanto por parte da procuradoria quanto por parte de ministros do STF.
Joaquim Barbosa, pintado pela revista Veja como o “menino que mudou o Brasil”, entrará para história como um dos mais incompetentes e desonestos juízes que já passaram pelo Supremo Tribunal Federal. A responsabilidade de Barbosa é particularmente grave porque ele acompanhou os inquéritos desde o início, antes mesmo de se tornarem a Ação Penal 470. Foi dele a decisão de manter toda a documentação fora do alcance dos próprios ministros do STF, até pouco antes do julgamento, de maneira que estes, sem tempo hábil para estudar a contento o processo, inclinaram-se a seguir a orientação do relator, ou seja, o próprio Joaquim Barbosa.
E agora, que os embargos trazem à tôna um oceano de inconsistências, mentiras e arbitrariedades, o próprio STF se vê numa sinuca de bico. Assistimos a uma interessante mudança nos ventos. O barquinho dos réus, que se dirigia aceleradamente na direção da cascata, onde se despedaçaria nas pedras lá embaixo, prendeu-se a um galho na margem e pode vir a ganhar proteção de uma rocha logo à frente.
O que eu temo, contudo, é que a sociedade se contente com uma migalha: que os embargos façam os ministros reverem as penas de Dirceu e Genoíno, que os dois não sejam encarcerados em regime fechado ou mesmo semi-aberto; mas os outros réus sejam lançados aos leões para satisfazer o circo romano da opinião publicada. Não penso apenas em Pizzolato, mas naquelas secretárias, algumas condenadas a penas superiores a conferidas a homicidas confessos. O que elas têm a ver com as negociatas políticas dos partidos ou, pior, com a trama ficcional inventada pela acusação e aceita pelo STF?
Estamos na Roma Antiga ou no Brasil do Século XXI?
A luta da sociedade, hoje, não é apenas evitar o dano político causado pela prisão, absurda e injusta, de José Dirceu, mas para salvar a honra do Supremo Tribunal Federal (STF) da vergonha histórica de pactuar com um golpe. Nos colégios e universidades, os professores já estão tendo que oferecer uma versão do que foi o mensalão. O Ministério da Educação terá que patrocinar livros de história que tratam do assunto. O que ensinaremos?
Lembro de Gilmar Mendes, com sua boca mole, vociferando em frente às câmeras da TV Justiça: “O que fizeram com o Banco do Brasil?” Pois é, melhor seria se perguntar: “Meu Deus, o que fizeram com o STF?”
O governo federal se manteve até agora intimidado, assistindo a tudo de camarote, mas não poderá fugir da luta final. Tem de investir pesado na disseminação das reportagens de Raimundo Pereira. Tem obrigação moral, educativa, de oferecer o outro lado dessa história. Sabemos, no entanto, que o mensalão teve como objetivo justamente pôr um cabresto no governo. Conseguiu. Jamais nenhum ministro de Estado protestou, de maneira clara, contra o desequilíbrio na cobertura do mensalão. Alguns, ao contrário, inicialmente até tentaram fazer do caso “uma página virada”, como se fosse natural, em pleno século XXI, cometermos sacrifícios humanos em prol de um projeto político.
O que, aliás, nem é o caso. O principal partido de oposição, o PSDB, incorporou de vez todas as características do antigo udenismo. Diante de um cenário econômico estável, com pleno emprego e salários em alta, o presidenciável Aécio Neves tem aparecido na TV se promovendo como o legítimo representante da ética na política. Em 2012, vimos José Serra atacar seu adversário mostrando imagens de Dirceu na televisão.
A desconstrução da farsa, portanto, deve ser feita não apenas em nome da verdade e da justiça; também cumpre um objetivo político. O povo brasileiro rechaçou um projeto que fracassou; não é justo que seja ludibriado a abraçá-lo novamente induzido por uma mentira disfarçada de “ética”. Não há nada de ético na condenação de inocentes. Ao contrário, se a corrupção política é um mal que corrói o desenvolvimento, a desonestidade judiciária desequilibra a democracia e mina o próprio Estado de Direito.
Com base nos documentos que temos à nossa disposição, estamos tranquilos que a história julgará os fatos com imparcialidade, e virá à tôna a iniquidade e covardia dos procuradores gerais e de alguns ministros do STF. O que nos preocupa, no entanto, é algo relativo à brevidade da vida humana. Por quanto tempo o STF, por submissão a interesses políticos e midiáticos, inflingirá sofrimento a réus inocentes? Por quanto tempo os juízes pretendem interferir na vida política do país mantendo acesa a chama de uma mentira?
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Concordo com Paulo Moreira Leite, autor de um excelente livro sobre o tema, de que é uma ilusão achar que teremos “a volta do cipó de aroeira sobre o lombo de quem mandou dar”, no caso do mensalão tucano. Até porque não interessa ao Brasil que as arbitrariedades contra os réus do mensalão sejam chanceladas através de uma repetição da mesma injustiça com réus ligados ao tucanato. Isso não deveria acontecer, e não acontecerá. Os réus tucanos serão julgados em duas instâncias, e o julgamento foi devidamente desmembrado. Serão julgados com calma e objetividade, sem nenhum clima de linchamento.
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Concordo com Paulo Moreira Leite, autor de um excelente livro sobre o tema, de que é uma ilusão achar que teremos “a volta do cipó de aroeira sobre o lombo de quem mandou dar”, no caso do mensalão tucano. Até porque não interessa ao Brasil que as arbitrariedades contra os réus do mensalão sejam chanceladas através de uma repetição da mesma injustiça com réus ligados ao tucanato. Isso não deveria acontecer, e não acontecerá. Os réus tucanos serão julgados em duas instâncias, e o julgamento foi devidamente desmembrado. Serão julgados com calma e objetividade, sem nenhum clima de linchamento.
A volta do cipó não será contra os tucanos. Será contra as arbitrariedades, leviandade, incompetência e desonestidade dos ministros do STF, caso não façam uma revisão total da Ação Penal 470. Joaquim Barbosa se tornou herói dos saguões de aeroporto, mas a História não precisa viajar de avião. A História viaja a pé, descalça, sentindo a terra e contemplando sem pressa a paisagem. Demora mais a ir onde quer, mas chega conhecendo minuciosamente os detalhes, desmascarando hipócritas, desnudando interesses, derrubando farsas.
Esperarei ansiosamente por esse encontro, que assistirei comendo pipocas, entre Joaquim Barbosa e a História…
Capítulo 7 - O julgamento do povo
Enviado por Miguel do Rosário on 27/05/2013 – 5:45 pm
A história de uma farsa – Capítulo 7
A luta pelo poder
Voltemos ao núcleo incandescente da história. O STF enveredou por uma farsa patética, mas suponho que as pessoas ainda acreditem na velha máxima: onde há fumaça, há fogo. O que os petistas fizeram de errado? O que houve, em suma?
Esta é minha versão da história, sem pretensão de pôr um ponto final. Com base na enorme quantidade de documentos, entrevistas, depoimentos, relatos que temos hoje à nossa disposição, o mais difícil é justamente separar o joio do trigo e oferecer uma interpretação objetiva e ordenada dos acontecimentos. Mas dados e fatos não faltam.
A campanha de Lula em 2002 havia sido bem abastecida de recursos contabilizados, e a prestação de contas fora aprovada pelo Tribunal Superior Eleitoral. Lula diplomava-se presidente da República. Delúbio Soares fizera um excelente trabalho como tesoureiro. Era um herói do PT.
Não fora uma vitória fácil. Lula e o PT lutavam contra um poderio arraigado há séculos. As campanhas da direita vinham se tornando cada vez mais eletrônicas, baseadas na televisão e nos meios de comunicação em geral. Desde meados da década de 80, a classe política tradicional havia avançado sobre canais de tv, estações de rádio e jornais impressos. Com eles, destruíam reputações, enalteciam personalidades, chantageavam empresários e, por fim, ganhavam eleições.
Para vencer este império difuso, relativamente organizado em torno de um grande eixo central, as Organizações Globo, o Partido dos Trabalhadores usou duas estratégias: de um lado, fez uma campanha nacional altamente profissional, contratando os melhores marketeiros do mercado e usando material gráfico de primeira; de outro, a militância em todo o país botou os pés na lama e correu o Brasil pedindo voto de porta em porta.
Quem poderá medir o esforço necessário para vencer um conservadorismo que detinha a máquina federal, a maioria dos governos nos estados e todos os meios de comunicação no país? Qual o valor real dessa campanha? Digo, não o valor em termos pecuniários, mas o valor humano?
Entretanto, por mais que enormes contigentes humanos trabalhassem espontanea e voluntariamente, por convicção política, por espírito de cidadania, ainda assim havia necessidade de muito mais. Um pacato cidadão de classe média, assistindo tranquilamente ao Jornal Nacional no sofá da sala, talvez encontre alguma dificuldade em conduzir sua imaginação até um comitê de campanha eleitoral. É ali onde tudo começa: a vitória, a derrota, as dívidas. É um frenesi constante. A militância partidária de base, seja de que partido for, de esquerda ou direita fisiológica, é pobre. O primeiro gasto de um comitê de campanha é alimentar a mão-de-obra. Se não há dinheiro, faz-se um acordo com restaurantes locais para se pagar posteriormente. É preciso pagar o transporte, impressão de santinhos, confecção de bandeira. As lideranças comunitárias, por sua vez, pedem reuniões com os chefes de campanha para negociar a contratação de seus exércitos. Não é uma operação de compra e venda. É política. A liderança comunitária não vende seu apoio a quem paga mais. Não necessariamente. Ela tem de pensar, sim, na eleição enquanto uma oportunidade para o povo ganhar uns trocados e sobreviver mais alguns meses. Mas há política envolvida. O candidato tem de ganhar sua confiança, e fechar compromissos políticos. Vai fazer uma obra de saneamento aqui? Vai construir uma escola e um posto de saúde acolá? E a liderança não pode ficar, de qualquer forma, na contramão do desejo de sua comunidade. Se ela quer votar em Lula, então a tendência é fechar uma parceria com um candidato que também o apoia.
Não podemos esquecer que grande parte dos recursos movimentados nas eleições voltam para o bolso do povo, na forma dos trabalhos que realizam nas infinitas atividades de campanha. Essa é uma realidade para legendas de todos os espectros ideológicos. A classe média cantarola um lulalá aqui, tenta convencer um amigo ali, cola um brochinho no peito, manda uns emails, e sai dizendo ao mundo que “trabalhou duro na campanha”. Mas não tem noção do que é, de fato, uma campanha eleitoral nas periferias das grandes cidades e no interior, onde se concentra o grosso do eleitorado.
Nas regiões pobres e populosas, as engrenagens da democracia ficam expostas ao ar livre. Ali se dá o processo originário de “compra de apoio político”. O cientista político Wanderley Guilherme dos Santos escreveu um ensaio, ainda antes do governo Lula, falando sobre “a corrupção democrática”. Numa democracia, a alta rotatividade dos cargos públicos oferece, periodicamente, uma nova leva de tentações humanas. Mas ele poderia ter mencionado uma outra característica ainda mais perturbadora da democracia: as campanhas.
A democracia apenas regulamenta, ordena e civiliza a luta pelo poder. Mas a luta em si, mesmo num processo democrático, permanece implacável. A democracia não anula a lei do mais forte. Se num debate, um candidato gagueja e demonstra medo ou fraqueza, perde pontos. O eleitor vota naquele que considera melhor e mais forte.
Em 2002, logo após a vitória de Lula, os comitês regionais do Partido dos Trabalhadores informaram que possuíam enormes passivos a serem resolvidos. Quando falamos em dívidas de campanha, também precisamos exercitar a imaginação. O político tradicional, dono de terras, lida com certa facilidade com esse tipo de problema. Com crédito farto nas instituições bancárias, ele pode “financiar” suas dívidas. Um partido de esquerda, cujas lideranças pertencem, em sua grande maioria, a estratos medianos ou baixos da sociedade, não tem crédito. Dívida de campanha, numa periferia pobre, pode se tornar um problema trágico.
O mensalão começa aí, portanto. No pagamento das dívidas de campanha de 2002, para os diretórios regionais. O PT não tinha dinheiro, nem crédito bancário. Aparece Marcos Valério, um sujeito que construíra, ao longo da era FHC, uma rede de contatos nas altas rodas do mercado financeiro, e se oferece como avalista de empréstimos. Depois pega empréstimos em seu nome para repassar ao PT. Tudo isso está nos autos e depoimentos.
As eleições de 2004 se aproximavam. O próprio Roberto Jefferson, conforme descreve Paulo Moreira Leite em seu livro “A outra história do mensalão”, diz que “o mensalão não era federal. Era municipal, porque as eleições de 2004 eram municipais e o dinheiro de Delúbio e Marcos Valério destinavam-se a essa campanha”.
Faz sentido que as eleições municipais sejam ainda mais problemáticas em termos de financiamento que a nacional. Tudo é mais obscuro e mais sujo numa eleição municipal. Com exceção de uma ou outra capital mais importante, não há dinheiro das grandes instituições financeiras, e os pequenos potentados locais preferem doar por baixo dos panos com receio de que, não ganhando seu aliado, enfrente represálias.
No julgamento da Ação Penal 470, os ministros do STF pontificarem sobre o que se deve ou não fazer numa eleição, como se eles tivessem alguma vaga ideia de como as coisas funcionam. Ayres Britto se recusou acreditar na versão de João Paulo Cunha de que o dinheiro que recebera seria para pagamento de uma pesquisa eleitoral, mesmo com esse apresentando notas fiscais. Britto não acreditou porque, segundo ele, 2003 não era um “ano eleitoral”.
Mais uma vez, o Brasil é vítima da desinformação. Tivemos duas décadas de ditadura militar, sem campanhas, sem eleições, sem informação. Não fizemos livros, filmes, não publicamos reportagens sobre o processo eleitoral na democracia moderna. Até hoje, os estudantes de ciência política estudam mais o processo eleitoral do Império e da Velha República, através dos livros de Victor Nunes Leal (Coronelismo, enxada e voto) e Raymondo Faoro (Os donos do poder) do que a realidade eleitoral contemporânea.
Os partidos políticos tem dinâmica interna. Antes do lançamento de uma candidatura, as legendas travam duras guerras domésticas, às vezes tão duras e sujas quanto o processo eleitoral em si. Quem será o candidato a deputado, a prefeito, a governador, por um determinado partido? É nessa hora que uma pesquisa faz diferença. E pesquisas confiáveis custam caro.
Não sou advogado de Cunha. Por mim, ele pode ter feito qualquer coisa com aquele dinheiro. Mas se ele apresenta notas ficais, uma versão consistente, e afirma que o recurso tinha fins eleitorais, o mínimo que se espera de um juiz é que respeite a sua história. Não estamos falando de um ladrão de galinhas, mas de um deputado federal eleito com uma quantidade colossal de votos. E para ser eleito, ele precisou, necessariamente, trabalhar duramente em sua própria campanha eleitoral.
Entramos em 2004, e Delúbio Soares começa a distribuir dinheiro para os quadros que integravam a sua corrente dentro do partido, com vistas a iniciar os trabalhos eleitorais. Em seguida, terão início as negociações entre os partidos que integrarão a base aliada. As lideranças se encontrarão e combinarão estratégias únicas de comunicação, e negociarão ajudas financeiras mútuas. Enquanto isso, o Congresso trabalha, com os mesmos partidos.
No dia 26 de maio de 2013 (ontem, domingo), o colunista Ilimar Franco, do Globo, publicou a seguinte notinha:
Usos e costumes - Entra e sai governo e a história se repete. O PMDB é tratado como parceiro de segunda categoria. Todos os dias porta-vozes do Planalto praticam a desqualificação de seu principal aliado. Foi assim também no governo Lula, que esnobou o partido até estourar o mensalão. Assim como o PT agora, o PSDB também menosprezava seus aliados no governo FH. Os tucanos, como os petistas, também queriam desbancar os aliados nos Estados. O ex-líder do governo FH Benito Gama, atual presidente do PTB, então no PFL, na época arrematou: “O PSDB tem que escolher. Dar um cargo para o B. Sá (deputado tucano) no Piauí ou aprovar a emenda da reeleição. Os dois não dá”.
Deixando de lado qualquer análise sobre o objetivo da nota, que é produzir cizânia entre PT e PMDB, enfraquecer a base aliada e abrir mais espaço para Aécio Neves crescer, vamos direto ao final. Observe como pensava o líder do governo FHC, Benito Gama: para aprovar a emenda da reeleição, o governo tinha que comprar apoio político dos outros partidos através da distribuição de cargos. A questão proposta por Gama foi respondida na prática: FHC conseguiu aprovar a reeleição para si mesmo.
No auge do escândalo, esse tipo de explicação começa a vir a tôna. O próprio Lula vai a televisão pedir desculpas ao país e dizer que o seu partido fez aquilo que todos os outros faziam. Lula foi sincero, mas seu depoimento não repercutiu bem. Seus adversários reagiram com ferocidade redobrada diante da franqueza lulista. A direita, com hipocrisia; a esquerda, com incompreensão.
Ué, mas o povo brasileiro não elegeu o PT justamente para mudar “tudo que está aí”? Não. A utopia de que a democracia brasileira poderia ser “higienizada” completamente é ridícula e irreal. Mesmo que todos os políticos se tornassem anjos exclusivamente interessados em fazer o bem à população, ainda assim teríamos o conflito de interesses. Operários, donas de casa, empresários, banqueiros, servidores, artistas, índios, sem-teto, cada um puxa para um lado e aplaudirá os esforços que seu representante fizer para ajudar sua classe.
O PT fez caixa 2 porque usou os empréstimos de Marcos Valério para pagar despesas de campanha, tanto as dívidas de 2002 quanto as de 2004, mas a tese de “compra de apoio político” tem um vício de origem: ignorância em relação ao processo democrático. A tese de compra de apoio político só pode ser levada minimamente à sério quando está em jogo um projeto para mudar a constituição e ampliar o poder do grupo hegemônico, como foi o caso da emenda da reeleição. E mesmo assim, deve-se tomar muito cuidado. Em toda a América Latina (inclusive no Brasil, com FHC), os presidentes mudaram suas leis para ampliarem seu próprio poder e, pese os protestos das respectivas oposições e os debates acalorados, prevaleceu a ideia de que foram processos democrativamente válidos. Entretanto, falar em compra de apoio político para se entender a reforma de previdência, que envolveu o país inteiro num debate extremamente duro e complexo, não faz nenhum sentido. O PT queria “dar um golpe” aprovando a reforma da Previdência? E para isso deu 15 mil reais ao professor Luizinho?
José Dirceu, por exemplo, está sendo condenado por fazer a coisa mais importante numa democracia: articulação política, construção de maioria parlamentar e busca da governabilidade. O sistema democrático tem seus freios e contrapesos, mas sem um grande concerto entre os diversos interesses políticos e econômicos conflitantes jamais haverá estabilidade e desenvolvimento. O Supremo Tribunal Federal comete uma infâmia ao criminalizar a política, porque é a política o único instrumento que nos salva do completo caos. E temos que considerar a política em sua acepção plena, objetiva, concreta, que inclui duras e complexas negociações partidárias, além de acordos eleitorais, envolvendo recursos de campanha. A nossa lei eleitoral, inclusive, deveria ser modernizada para dar mais liberdade aos partidos para se aliarem e integrarem campanhas. Algumas coisas que hoje são irregulares, poderiam ser legalizadas.
Uma das consequências mais negativas do processo do mensalão foi a desqualificação do próprio conceito de ética. De repente, conseguiu-se transmitir à sociedade que tudo relacionado à política (luta pelo poder, pagamento de dívidas de campanha, estabelecimento de acordos eleitorais e partidários, construção da governabilidade) era sujo; e do outro lado, nas limpas e ordenadas redações de jornal, reinava a ética. Depois se mostraram juízes de capa preta, rosto asséptico e severo, transitando por salões brilhantes e luzidios, como os úlitmos éticos de uma nação decadente. De fato, que diferença entre o ambiente esterilizado do STF e um comitê de campanha em Belém do Pará, todo sujo de papéis, infestado de militantes de olhos famintos! Ou ainda de uma reunião num apartamento de luxo em Brasília, com políticos bebendo uísque, falando palavrões, insinuando negociatas e partilhando estratégias de campanha! No entanto, a mocinha democrática sente-se muito melhor nesses dois últimos ambientes, o comitê bagunçado e o apartamento cheirando a uísque, do que num tribunal. Ela sabe que estará mais protegida na companhia de militantes pinguços e políticos de olhos lúbricos, que a conhecem há muitos anos, do que ao lado de juízes intimidados por barões da mídia. Entre a donzela democrática e os políticos, existe o julgamento de 100 milhões de eleitores, que decidirão com quem ela deverá se deitar. Entre ela e os ministros do STF, temos a opinião de tão somente 11 cidadãos fortemente influenciados pelo ambiente de classe em que circulam, vulneráveis à chantagem, à vaidade e à corrupção.
O maior fiasco da história
Capítulo 8 - A pedrinha de David
Enviado por Miguel do Rosário
on 05/06/2013 – 3:53 pm
A história de uma farsa – Capítulo 8A pedrinha de David
Desde o início, o processo do mensalão ofereceu um triste espetáculo de mentiras, traições, covardia. O julgamento no STF não foi diferente. Os ministros mais famosos por seu respeito ao garantismo e à letra da Constituição mancharam sua própria história ao capitularem à infame pressão de uma mídia notoriamente engajada politica e partidariamente.
Entretanto, a história registrará ao menos um exemplo de heroísmo. Um heroísmo prosaico, delicado, feminino, composto apenas de inteligência, amor, lealdade e desejo de justiça.
Falo da gentil e doce Andrea Haas, arquiteta e esposa de Henrique Pizzolato. Quando a história definitiva do julgamento for escrita, seu nome não poderá ser esquecido como aquela que lançou a pedrinha que ajudou a derrubar um dos homens mais poderosos do país, o atual presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa.
A ironia é que diversos réus contrataram os escritórios de direito mais competentes da America Latina, incluindo Marcio Thomaz Bastos, um dos maiores criminalistas brasileiros, mas ao cabo foi Pizzolato, o réu mais frágil financeiramente (seus advogados, embora bons, trabalham praticamente de graça), quem teve a defensora mais combativa e mais astuta. Sua própria esposa.
Quando o mundo inteiro parecia desabar sobre a cabeça do casal, Andrea Haas começou a estudar o caso por conta própria. Sozinha, elaborou para seu marido a mais contundente defesa que um réu jamais sonhou ter. Quase todas as reportagens, documentos e raciocínios lógicos que hoje comprovam, definitivamente, a inocência de Pizzolato, ex-diretor de marketing do Banco do Brasil, e derrubam os pilares de toda a absurda trama criada pela Procuradoria Geral da República, nasceram da luta de uma mulher indignada pela condenação injusta do seu companheiro de toda uma vida, de um homem cujos anseios por justiça social, integridade e coragem, acompanhou e admirou desde a mocidade. (Leia a emocionante carta de Andrea a seu marido).
A última pedrinha com que este David de saias derrubou o Golias – esse estamento híbrido formado por mídia, oposição conservadora e figuras desqualificadas da procuradoria e STF – talvez tenha sido lançada esta semana, com a divulgação em larga escala de uma denúncia gravíssima. Na verdade, essa denúncia apenas completa (ou chega bem perto de completar) um quebra-cabeça, cujo desenho Andrea Haas já conhece há tempos.
A denúncia consta de recente artigo de Maria Inês Nassif. A jornalista do site Carta Maior denuncia, com base em documentos coletados e ordenados logicamente por Andrea, o então procurador geral da república, Antônio Fernando de Souza, e o relator do processo antes do mesmo se tornar a Ação Penal 470, Joaquim Barbosa: eles sabiam da inocência de Pizzolato e, portanto, da inconsistência da tese de acusação, bem antes da denúncia ser discutida e aceita pelo Supremo Tribunal Federal. Não apenas sabiam da existência desses documentos, como os esconderam deliberadamente.
Os leitores então me perguntam: e agora, Miguel? O que acontece? É possível anular Ação Penal 470? Dê sua opinião, por favor!
Diante de inépcia tão flagrante, acho que é possível, sim, anular a Ação Penal 470. E se não for, agora há elementos mais consistentes para se levar o caso a uma corte internacional.
É óbvio, no entanto, que não será fácil. Como no caso Dreyfus, na França, as pessoas e entidades envolvidas na acusação enredaram-se tão profundamente nessa teia de mentiras que será difícil encontrar uma saída “honrosa”. Nada melhor do que um divertido ditado popular para definir a situação em que se encontra o STF: um mato sem cachorro.
Quem será o cachorro a tirar o STF da enrascada em que se meteu, ao se submeter covardemente ao clima de linchamento criado pela mídia?
Como explicar à nação que o tipo de prevaricação cometido pelo Procurador, por Joaquim Barbosa e por alguns outros ministros foi bem pior do que os crimes eventualmente cometidos pelos réus? Muito pior, porque se houve crime (e não posso saber se os réus são inocentes em tudo), com certeza não foi aquele da tese da acusação, enquanto o procurador e Joaquim Barbosa pactuaram com um golpe branco. Os quarenta réus acusados pela denúncia da Procuradoria foram escolhidos da forma mais odiosamente arbitrária e tendenciosa entre os 126 relacionados na CPMI dos Correios. A trama foi discutida e escrita primeiro; depois foram colhendo somente os réus, testemunhas e documentos que podiam corroborá-la. Até mesmo a dona lógica foi posta de lado quando se interpunha no caminho da acusação.
Agora temos provas de que, antes da aceitação da denúncia pelo plenário do STF, o procurador geral da república e Joaquim Barbosa conheciam o Laudo 2828 e outros documentos que inocentavam Pizzolato (e, repito, derrubavam toda a Ação Penal 470), e não só os esconderam dos demais juízes e advogados de defesa, como ainda mentiram descaradamente sobre seu conteúdo.
Vamos focar um pouco na questão das datas, porque elas são fundamentais para se visualizar o grau de sordidez da procuradoria e do ministro Joaquim Barbosa.
O Laudo 2828 é fruto de uma investigação da Polícia Federal junto ao BB e à Visanet, feita a pedido da própria Procuradoria e deferido por Joaquim Barbosa, ao final de 2005. A PGR, no entanto, estranhamente, não aguarda a conclusão do laudo, que acontece em dezembro do mesmo ano, para apresentar a denúncia, em março de 2006. O laudo foi mantido em segredo, inclusive dos próprios ministros do STF (à exceção de Barbosa), antes e durante a aceitação da denúncia, que ocorreu em agosto de 2007. Só foi anexado à Ação Penal em novembro de 2007, meses depois do STF aceitar (com a faca no pescoço, conforme disse Lewandowski) uma denúncia inepta, e dois dias depois da publicação do seu acórdão. Os ministros, quando julgaram a validez da denúncia, não tiveram acesso a um dos documentos mais esclarecedores da Ação Penal.
Hoje temos à nossa disposição documentos contendo datas e carimbos que comprovam a postura desonesta da PGR e de Barbosa, e há uma novidade. Há apenas algumas semanas, ficamos sabendo que os mesmos atores (PGR e Barbosa) usaram de um artifício maquiavélico para esconder os documentos que “atrapalhavam” a sustentação da tese do mensalão, entre eles o laudo 2828. Não só isso. Tudo aquilo que negaram aos réus petistas, concederam aos “tucanos”. E nem falo dos tucanos do mensalão mineiro, e sim dos servidores do BB, nomeados na gestão FHC, arrolados nas mesmas acusações que se imputaram a Pizzolato, réus num inquérito em separado conduzido na 12ª Vara de Brasília: desmembramento (não entraram na Ação Penal 470), julgamento em primeira instância, e direito a uma investigação sigilosa, sem exposição pública.
Quando se descobriu a existência desse inquérito, soube-se também de outra investigação em andamento no STF, de número 2474, para a qual desde o início foram encaminhados documentos, entre eles o Laudo 2828, que poderiam criar um estorvo para a Ação Penal 470. O diálogo entre o PGR e Barbosa (registrado nos autos), tentando explicar porque documentos e réus, referentes aos mesmos crimes que se imputavam a réus da Ação Penal 470, deveriam figurar em inquéritos em separado, entrará para a história como exemplo “supremo” de cinismo judiciário.
Diz Barbosa, em resposta ao pedido do PGR para “desmembrar” o inquérito envolvendo não-petistas e documentos incômodos, no dia 10 de outubro de 2006:
“(…) defiro o pedido para que os (novos) documentos sejam autuados em separado, como (novo) inquérito. …Por razões de ordem prática, (para não) gerar confusão…”
Não gerar confusão… Ou seja, não atrapalhar os planos de dar consistência a uma tese caduca desde a origem, e acusar inocentes.
Outros réus do BB, arrolados na mesma acusação que Pizzolato, ficaram a salvo do linchamento público promovido pela mídia. E os documentos que poderiam trazer obstáculos à condenação dos réus da Ação Penal 470 foram guardados sob o tapete de inquéritos secretos.
Em termos de cinismo e inépcia, contudo, nada pode superar a própria denúncia de Antônio Fernando de Souza, encaminhada ao STF, e aceita pela maioria dos ministros. O PGR afirma que “Pizzolato em atuação orquestrada, desviou vultosas quantias do Fundo de Investimento Visanet, constituído com recursos do Banco do Brasil” e apresenta como principal prova documental uma auditoria feita pelo Banco do Brasil.
A acusação é do tipo barbosiano: contém tantos erros numa só frase que mereceria se tornar um editorial do Globo.
O nome do Fundo não é Fundo de Investimento Visanet. Fundo de Investimento supõe um cabedal com sócios-proprietários. O nome verdadeiro é Fundo de Incentivo Visanet, e os documentos comprovam que pertence exclusivamente à empresa Visanet. A auditoria mencionada cobre o período de 2001 a 2005. Pizzolato foi nomeado apenas em fevereiro de 2003; o petista é também culpabilizado, portanto, por um período (2001 e 2002) no qual sequer trabalhava na diretoria de marketing. Não há nenhuma prova de “ação orquestrada”. Pizzolato não tinha nenhum poder de ingerência sobre os recursos em questão. O cargo de diretor de marketing, na hierarquia do Banco do Brasil, era secundário; e os que tinham alguma influência sobre a gestão do fundo Visanet, que era dinheiro privado, eram outros servidores, não Pizzolato, conforme atesta o laudo 2828, pedido pelo próprio procurador e deferido por Joaquim Barbosa.
Quando encaminha o Laudo 2828 ao STF, já depois que a denúncia havia sido aceita, o procurador mente deslavadamente:
“Em que pese seu teor ser de leitura obrigatória…, alguns trechos do Laudo 2828/2006 merecem destaque, pois confirmam a imputação feita na denúncia de que Pizzolato e Gushiken beneficiaram a empresa de Marcos Valério.”
Mentira. O Laudo 2828 sequer menciona o nome de Pizzolato ou Gushiken.
Como se não bastasse, hoje sabemos que Barbosa, durante o julgamento, cometeu um erro crasso sobre a data da morte de um dos réus. Mais uma prova de sua incompetência e desonestidade. Em sua ânsia de impor a pena mais severa possível a José Dirceu, uma ansiedade indigna de um juiz, Barbosa informou ao plenário que José Martinez, então presidente do PTB, ainda estava vivo em dezembro de 2003; ele havia falecido em setembro. A informação foi aceita e usada para que as penas impostas a Dirceu fossem mais pesadas, visto que, em dezembro de 2003, a legislação brasileira, por orientação de Lula, se tornara mais severa contra a corrupção. E olha que o ministro Marco Aurélio Mello observou, enfaticamente, que a data era importante justamente por causa disso.
Curioso notar que nenhum meio de comunicação, apesar das centenas de repórteres e especialistas diuturnamente analisando e acompanhando o julgamento, que acontecia ao vivo na TV Justiça, identificou o vexame de Barbosa.
Agora, mais que nunca, cresce a convicção de que a população brasileira foi mais uma vez vítima. Promoveu-se, em canais de tv que são concessão pública e que recebem bilhões de reais de publicidade pública, uma mentira ao povo, de que o julgamento seria uma vitória “histórica” contra a corrupção. Foi o contrário. Testemunhamos o maior fiasco da história do STF, uma capitulação vergonhosa ao poder da mídia, ao conservadorismo e a todos os setores derrotados pelo sufrágio popular. O processo conhecido por mensalão foi a oportunidade para se obter uma revanche à vitória eleitoral de Lula em 2002, e para isso arrolaram-se todos os truques, todas as mentiras, todas as armas ainda à disposição do conservadorismo.
Derrotar essa mentira, ou este “mentirão”, conforme bem denominou a corajosa jornalista Hildegard Angel, é uma tarefa coletiva de todos os que lutam por justiça.
A corrupção tem de ser combatida duramente, e temos que aprimorar constantemente nossos hábitos políticos, mas jamais conseguiremos isso condenando inocentes e chancelando farsas.
http://www.ocafezinho.com/2013/06/05/o-maior-fiasco-do-seculo/
Capítulo 9 - O papel da mídia
A conspiração
Enviado por Miguel do Rosário
on 07/06/2013 – 5:16 pm
A história de uma farsa – Capítulo 9O papel da mídia
Uma das virtudes fundamentais no espírito de um jornalista é a ojeriza a teorias de conspiração. É uma virtude, no entanto, que beira um vício, porque o mesmo pensamento racional, a mesma objetividade, que nos aconselha a manter distância de discursos paranóicos e teorias de conspiração, nos obriga a aceitá-los quando estamos diante de documentos e provas irrefutáveis.
A divulgação de milhares de documentos secretos da diplomacia norte-americana, pelo Weakleaks, consistiu, por exemplo, numa inesquecível vitória moral para milhares de pessoas que acusavam, há décadas, os EUA de promoverem golpes de Estado em países do terceiro mundo. Na época, um divertido argumento fez sucesso nas redes sociais: “sabe aqueles malucos que viviam culpando a CIA por tudo? Estavam certos.”
A bem da verdade, não foi apenas o Weakleaks. Algumas leis que obrigam a divulgação de documentos do governo americano com mais de trinta ou quartenta anos, também ajudaram.
Mas ser jornalista não é dizer a verdade. Essa é a função, talvez, de filósofos. Jornalistas divulgam documentos e fatos concretos, e a verdade que buscam é apenas aquela que podem comprovar com base neles. O uso da lógica, porém, não é vetado aos jornalistas. Nem a imaginação, desde que usada com parcimônia.
No processo do mensalão, todavia, a imaginação se tornou a virtude fundamental do jornalismo político. Reportagens, colunas, análises, passaram a se descolar cada vez mais de qualquer prurido factual e inagurou-se uma nova era quase psicodélica na imprensa brasileira. Teorias eram montadas e desmontadas sem qualquer escrúpulo. O fato de inúmeras denúncias serem desmentidas no dia seguinte não tinha mais importância. Um clima de total liberdade de expressão enfim se instalara nas redações nacionais.
Quando os historiadores se debruçarem, daqui a alguns anos, sobre o mensalão, o tradicional rigor acadêmico possivelmente lhes obrigue a dividir o tema em várias seções: política, mídia, partidária, jurídica.
Em meu modesto esforço para escrever sobre um caso ainda em curso, e portanto ainda influenciado pelo clima barra pesada, sufocante, de tribunal, estamos tateando em todas as áreas, mas a corda que uso para não cair são documentos. Por isso tenho sido repetitivo quanto ao caso Pizzolato. É que me parece o caso mais surreal, kafkiano e… documentado. A sua inocência é documentada.
Se a grande mídia fizesse uma ampla reportagem sobre os erros na condenação de Pizzolato, mostrando os documentos, apresentando-os a juristas conceituados e pedindo sua opinião, testemunharíamos uma sumária desmoralização da Ação Penal 470. Aliás nota-se hoje um barulhentíssimo silêncio nos grandes jornais e nas redes de TV sobre o debate tão aceso nas redes sociais e blogs, sobre os erros do STF. A ruptura da mídia com a sociedade se tornou completa. O artigo da Inês Nassif, por exemplo, abordando a suja história do Laudo 2828, que inocenta Pizzolato, tornou-se imediatamente o mais lido em todos os principais blogs políticos no país, mas o assunto é virtualmente proibido na grande imprensa. A mesma coisa vale para o erro crasso de Barbosa quanto a data da morte de José Martinez.
A nossa presidenta gosta de repetir o clichê supostamente pró-democrático, sobre preferir o barulho da imprensa ao silêncio da ditadura. É uma frase bonita, mas a verdade é que o único barulho que a imprensa quer ouvir, no caso do mensalão, é o da tampa de um caixão se fechando. A nossa mídia não é boba. O espaço à divergência se dá apenas em questões não estratégicas. E o mensalão é um assunto absolutamente estratégico para os grandes grupos de mídia, que se tornaram, assumidamente, o grande partido do conservadorismo brasileiro.
Entretanto, mesmo durante o julgamento, quando o assunto ocupava, diariamente, várias páginas de jornal, e hegemonizava o noticiário televisivo, havia muitos mais fogos de artifício do que conteúdo. Não havia um debate sério sobre o tema. O tal “barulho da imprensa”, tão ao gosto da nossa chefe de Estado, era apenas um ruflar histérico dos tambores da oposição. Os réus, porém, não eram só aqueles perfilados na denúncia da Ação Penal 470, mas toda a sociedade, incluindo os elementos raivosos que pagavam anúncios no Facebook para promover páginas repletas de indizível rancor. Todos são vítimas do maior processo de manipulação da informação de que temos notícia.
O mensalão foi o canto do cisne da grande mídia brasileira. O escândalo é deflagrado exatamente no momento em que a internet ainda não havia sido “apropriada” pela sociedade. Os únicos blogs políticos estavam em mão da grande mídia de oposição: Noblat e Reinaldo Azevedo. A imensa ágora pública, caótica e democrática em que se tornou a internet brasileira não havia se constituído nos anos de 2005 e 2006. A imprensa reinava sozinha. Se hoje ela ainda tem um poder descomunal para influenciar o espírito nacional, naquela época esse poder era quase absoluto.
Uma das seções mais importantes no estudo do processo do mensalão, portanto, é o papel desempenhado pela mídia. É um papel que ainda está sendo desempenhado. Hoje, sexta-feira 07 de junho, uma notícia deixou inteiramente perplexos a grande nação de internautas: o único jornalista convidado pelo ministro Luiz Fux para dar uma “aula pública” aos ministros do STF sobre financiamento de campanha será Merval Pereira, colunista e membro do conselho editorial do jornal O Globo.
A promiscuidade entre a grande mídia, em particular a Rede Globo, e o STF, parece não encontrar limites. Até mesmo os juízes mais resistentes à pressão da mídia, como Lewandovski, ligavam para Merval, no dia seguinte a sessões, para “explicar” seus votos. Joaquim Barbosa, por sua vez, liga regularmente para Merval para justificar algum de seus destemperos.
E Ayres Britto escreveu o prefácio do livro de Merval Pereira sobre o mensalão enquanto ainda era presidente do Supremo Tribunal Federal (STF)!
Se a mídia é um poder terrível em qualquer parte do mundo, uma concentração absoluta numa só empresa empresta-lhe um ar perigosamente antidemocrático.
A maior parte da “pressão social” alardeada pela grande mídia, e usada pelos próprios ministros do STF como justificativa para a incrível criatividade com que se portaram no julgamento da Ação Penal 470, a ponto de ser qualificado, de maneira promissoramente corajosa pelo mais novo ministro, Luís Roberto Barroso, de “um ponto fora da curva”, veio da Rede Globo. Com toda certeza, os ministros se portavam no tribunal com um olho não na população brasileira, não na História, mas em como seriam caricaturizados no Globo no dia seguinte. As notinhas de Ancelmo Gois sobre Joaquim Barbosa, alardeando sessões de aplauso no metrô de Ipanema e shows da Marisa Monte, e mencionando, orgulhosamente, a criação de um site para lançar a candidatura presidencial de Joaquim Barbosa, parecem ter surtido um efeito narcótico poderoso no espírito de todos os juízes. Da mesma maneira, a mesma mídia incitava agressões verbais ou mesmo físicas contra Lewandosvki, único ministro que ousou se contrapor, e mesmo assim timidamente, à agressividade inacreditável de Joaquim Barbosa.
No início do texto, eu falava na ojeriza à teorias de conspiração com importante virtude jornalística. Mencionei também que esta virtude pode se tornar um vício se nos recusamos, mesmo diante de evidências, em aceitar a existência de uma conspiração. O que vimos no processo do mensalão nos traz esse dilema. Todos os fatos, documentos, ações, discursos e posturas, apontam para uma conspirata política. Uma conspirata da qual participaram os dois procuradores gerais da república, Joaquim Barbosa, a oposição, a mídia. O próprio governo, vergado, intimidado, aterrorizado com a possibilidade de um golpe, talvez tenha pactuado, em parte, com tudo isso, sacrificando seus próprios companheiros em prol da sobrevivência. Enfim, estamos diante de um jogo político extremamente barra-pesada.
Mesmo com evidências, porém, este é um terreno que devemos trilhar com cuidado. Não podemos largar a corda que nos impede de cair no abismo. O mensalão ainda é uma história cheia de segredos, desagradáveis para todos os lados. É um processo e um julgamento ainda em curso. No próximo capítulo, faremos algumas incursões na seara propriamente política da nossa história, comentando seus desdobramentos presentes e futuros.
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Prefácio: Mensalão, a história de uma farsa.
Capítulo 1: Acusações contra Pizzolato lembram Dreyfus e Kafka.
Capítulo 2: O caso Visanet.
Capítulo 3: As bombas lá fora.
Capítulo 4: Tirem as crianças da sala.
Capítulo 5: As bombas aqui dentro.
Capítulo 6: A história não anda de avião.
Capítulo 7 - O julgamento do povo
Capítulo 8: A pedrinha de David
Capítulo 9: O papel da mídia
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